domingo, 19 de março de 2023

Funk e a indústria cultural

 


“CONHECE-TE A TI MESMO”

 

 

Por Amauri Nolasco Sanches Júnior

 

 

Já que estou em casa com minha gastrite atacada – que me levou a ter longos ataques de tosse e uma insônia de sábado para domingo com som de funk na minha orelha – querendo sair e não podendo, resolvi escrever esse artigo no meu blog que esta parado a um bom tempo. Neste mês, no meu bacharelado em filosofia, estou estudando sociologia que começa no século dezenove e até hoje é consolidado como uma ciência. Com essas polemicas com a Mc Pipokinha(que se autodomina “a rainha da putaria”), resolvi pesquisar para escrever um artigo bem mais elaborado (vai sair do Prensa, provavelmente). E fiquei lendo que o funk carioca e outros, são considerados marginalizados. Será mesmo? será que musicas que tocam em programas de TV – sem o menor pudor – são mesmo marginalizados?

Como poderia definir uma indústria cultural? Segundo Adorno e Horkheimer, a indústria cultural são produções de grande escala que são para as massas. E não são só os filmes de heróis ou coisas do gênero, muitas obras cult (que os inteligentinhos adoram) são feitas para serem consumidas em massa como outras obras. Exemplo foi o filme O Poço da Netflix ou Os Pássaros que muitas pessoas não entenderam nada (que foi a grande crítica do Matrix 4 e ninguém entendeu nada) e ficaram postando coisas que nada tinham a ver, os dois filmes, pelo que lembro, tem texto aqui. Mas, por que nuances não são entendidas? As pessoas analisam muito pouco hoje em dia. Daí a resposta fica fácil: a alienação (o discurso vigente) não deixa nada se aprofundado (nesse contexto Baumann dirá que tudo virou líquido) e a questão da critica como forma de aprofundamento das questões principais de um filme ou de uma música.

Não vamos ser nostálgicos, todo conteúdo dos anos 80 (incluindo o pop, brega e derivados) são uma tentativa de se criar a nossa indústria cultural e levou a isso o que estamos vendo. Uma Banheira do Gugu não é diferente de um BBB ou programa afim. Um palhaço Bozo é diferente de um Tic Tac ou um Carequinha (fora o Arrelia), porque o Bozo foi fabricado (esse é o termo correto) para produzir a indústria cultural desde a infância. Se a Globo lança as apresentadoras “sexys” – depois varias emissoras vão copiar – o SBT lança o palhaço importado, o palhaço que foi feito para o comercio. Do mesmo modo nos Estados Unidos, o He-Man (uma mistura de vários heróis conhecidos) foi fabricado para vender brinquedos.

Diferente na indústria norte-americana – que sabemos ditar uma certa tendencia – a nossa indústria cultural explora certas tendencias que aparecem com o tempo. Por muito anos se explorou muito as chamadas “boy band” como o Menudo (Porto Rico é um puxadinho americano), e como pegou, as pessoas começaram  a consumir esse tipo de banda. O que não podemos esquecer que na verdade, o brasileiro em sua maioria não escuta e nunca escutou “boy band” ou coisa parecida. Uma das maiores celebridades da musica sempre foi Roberto Carlos e Amado Batista, onde os dois fizeram fortuna com tais músicas românticas. São da indústria cultural? Claro que são. São uma espécie de menestréis da era moderna e que faz musica que coloca na grande massa em posição a baixo. Você nunca vai conquistar quem você quer, porque ela vai te trair e ele vai embora. Ou seja, você é um “bosta” que não vai ser ninguém. Herança católica.

A meu ver, o funk (nas letras) tem a ver com a normalização da sexualidade precoce como se fosse importante  ou a normalização da nossa parte cultural da não escolarização. Você não tenta mostrar uma coisa dentro de um conhecimento mais refinado (assim deveria agir os verdadeiros subversivos), onde vale criticas muito mais severas contra o poder. Não a toa, há um aumento significativo de sites pagos de garotas vendendo fotos nuas e sem pudor dizer que não exercem seus ofícios. A sexualização dos anos oitenta e noventa, levaram pessoas a normalizarem esse tipo de coisa. Ora, e quem estudou e quer trabalhar onde se dedicou? Milhares de mulheres e homens também, são abusados quando crianças e não é esse tipo de coisa vai denunciar. O poder não se importa com musicas de duplo sentido, direto é muito mais eficiente. E no mais, o funk (se era marginalizado no passado) entrou já no rol da indústria cultual.

Se a grande massa consome ate mesmo as suas polemicas, então, segundo a teoria critica, entra no rol dos meios de alienar a grande maioria. Ou não? Quando você incentiva a grande maioria a não estudar e só saber de sexo e diversão, a quem isso se beneficia? Na verdade, há uma grande diferença do ócio como contemplação daquele momento, com esse tipo de diversão que não leva a nada e a nenhuma reflexão. Na essência, a ética (como ETHOS) se esvazia para dar lugar a uma critica social vazia, pois, gritar aos quatro ventos que é a rainha da “putaria” não vai chamar atenção no machismo e nem ostentar bugigangas vai chamar a atenção na desigualdade brasileira. A questão, queiramos ou não, é ter uma sociedade refém da ideia  muito superficial de coletividade e majoritariamente, mesquinhez. Você não pode reclamar de desigualdade se você mesmo esta promovendo essa desigualdade ou pondo no ultimo volume esse tipo de musica ou sendo mesquinho.

Na essência, como disse muito bem Cazuza, fazem do país um grande “puteiro” que assim se ganha mais dinheiro e mais,  o povo acha que esse tipo de alienação (muitas vezes, incentivadas por universidades e escolas superiores que deveria incentivar o refinamento do gosto da grande maioria de universitário para ter um modo critico) vai trazer alguma mudança, mas, só vai incentivar o discurso da extrema-direita moralista. O movimento “redpill” se forma como reação (reacionarismo) desse tipo de discurso e no mais, uma das maiores subversividades que podemos ter é estudar e procurar conhecimento. O conhecimento é muito mais do que mera informação, tem a ver em ler e pesquisar.

Na essência, o conceito do esclarecimento tem a ver com uma ideia geral do iluminismo como movimento de conhecimento através da razão. Por outro lado, muita razão nos leva a aniquilação do sentir e no sentir que tomamos as decisões. Muita razão ficamos antipáticos, muito sentimentos ficamos passionais.

Tio Marx iria odiar essa esquerda. 

quarta-feira, 8 de março de 2023

Feminismo funkeiro só é ‘putaria’, feminismo não é isso

 



“Essa mulher fala dezoito línguas, e não pode dizer não em qualquer uma delas.”
DOROTHY PARKER


Por Amauri Nolasco Sanches Júnior

 

 

Um dia eu coloquei no meu Facebook a frase: “MC Pipokinha pensa mais do que participante de grupo de filosofia”, porque é uma provocação. Acham mesmo – ninguém percebe mais – a ironia que a filosofia pode ter em lançar falas para provocar discussões? Umas das coisas importantes para quem gosta de filosofia é interpretar texto (por isso mesmo existe a hermenêutica) e fazer o exercício de ser uma pessoa aberta, mesmo com uma cultura bastante passional como a nossa. A questão é: a MC (Mestra de Cerimonia) Pipokinha (com “k”) fala muito mais espontaneamente do que um estudante de filosofia que quer ser “pomposo” e achar que paga de inteligentinho, isso não podemos negar. Mas, algumas considerações podemos fazer da Pipokinha.

Semanas atras – assim como aconteceu com a Valeska Poposuda de forma irônica e a imprensa fez parecer sério – vi em um Instagram de filosofia uma capa da coleção Os Pensadores (que eu tenho) com  o nome da Pipokinha, é diz considerações bastante reais sobre o que eu penso naquele momento no Instagram. Porque a vários anos em um grupo de filosofia – que acabou por causa da polarização – vieram dizer que a filosofia estava começando se tornar uma Filosofia Funkeira. O grupo terminou, mas, essa questão ficou na minha cabeça como uma questão dentro da filosofia, pois, realmente, assim como a musica se tornou uma música fácil e muito dentro do sexo e da liberdade desmedida, a filosofia também esta ficando. Agora indo mais além do que os inteligentinhos (que acham que estão fora da caverna e não estão), o funk só é a construção da nossa cultura ao longo das últimas décadas após o militarismo. Houve o começo de tudo dentro das musicas de duplo sentido – a maior parte promovidas pela Globo – que no começo dos anos 90 começaram a circular dentro das muitas mídias. Somos uma geração guguziana (derivado do apresentador Gugu Liberato), onde haviam banheiras com mulheres seminuas, onde iam cantoras como Gretchen em programas como o Bozo (que sabemos que ela teve um caso com ele). Mas, antes de tudo, somos a cultura da putaria bem mais antes do que tudo isso, pois, somos uma cultura sexualizada (um psicanalista como Freud, pode dizer que pode ser milênios repreendido graças ao cristianismo).

Sem a menor dúvida – sem sermos hipócritas – que periferias sem a menor educação cantam musiquinhas iguais o funk nas brincadeiras, porque os pais não querem educar seus filhos sexualmente. Preferem que eles aprendam sozinhos. E se aprenderem errado? E se outro adulto ensinar o que não deve? Mas, sem ser hipócrita também, graças a mídia porca que acha que isso é liberdade, é uma forma de contestação da nossa sociedade hipócrita que na frente prega a moralidade e por trás, prega a putaria e ate gosta. Meninos e meninas são abusados e mortos, muitas vezes. As mães dessas pessoas que são assim, receberem mal tratos do marido e tendem a cantarem essas coisas, para chamar a atenção. Claro, isso não justifica nada e nem deve.

E ai entra o verdadeiro feminismo que visava não o aniquilamento dos homens e a supremacia feminina. Igualdade de gêneros não é mudar termos ou mudar palavras para atrair empatia, as coisas não são tão superficiais ou simples, existem meios muito mais profundos. As ironias do Felca (já escrevi um texto sobre seu canal aqui no blog) em dizer que os shows da Mc Pipokinha parecem acasalamento de primatas, não é mera bobagem e nem tem a ver com classes sociais (a Pipokinha mesmo disse que ganha 70 mil em um show). O que ele quis dizer é o mesmo que Aristóteles disse a dois mil anos atras, somos animais racionais e como animais racionais, temos que raciocinar atos e atos tem suas consequências. E a forma de se ter um só parceiro fez da nossa espécie manter territórios e ser mais livres para produzir seu próprio alimento. Isso é fato. Agora, esse modelo não servir mais, são valores que podem ser debatidos e analisados.

Filosoficamente, o filosofo Michel Foucault (1926-1984) debruçou muito na questão da sexualidade e chegou na mesma conclusão que cheguei, foi a era vitoriana hipócrita que levou a isso. Foucault e assim como eu, somos nietzschianos e sabemos muito bem, que tudo que Nietzsche prognosticou aconteceu no século vinte. E nossa cultura começa a ser hipócrita a partir da negação do nosso pertencimento não da cultura europeia e nem a anglo-saxã, mas, a cultura latina. As américas eram povoadas por indígenas que criavam filhos em conjunto, não tinham mulheres fixas e nem achavam isso um problema. Os africanos tinham um modo semelhante. E, na verdade, o europeu sempre achou isso ruim por se encher de amante e transar escondido. A questão é: é um modo racional ter um parceiro (onde há segurança) ou vários e você não sabe com quem o outro se relaciona? Você não pode pegar alguma doença venérea?

São modos e culturas que começam a ser analisados e devem ser analisados sem ataques, a filosofia sempre fez isso. Será que ser mulher é se autodominar a “rainha da putaria”?