Amauri Nolasco Sanches
Júnior
(bacharel em filosofia)
"aquele que ama o mito é de alguma forma filósofo" (Metafísica A, 2 982b 18-19).
Eu tenho uma forma “particular” de ver a religiosidade,
porque como filosofo (philosophós) tendo a ver as coisas em conceitos diferentes
como símbolos místicos das religiões de uma outra forma. Mas não sou ateu. Gosto
de pensar em uma consciência cósmica (não sabemos a sua origem e a magnitude de
sua existência), como algo que enxerga tudo e mesmo assim, não interfere em
nada. Poderíamos dizer, como os gnósticos, um “deus cego”. Por outro lado – porque
as universidades estrangeiras são muito mais sérias do que as nossas – na história
da filosofia, houve muito mais filósofos deitas (que acreditam em Deus) do que filósofos
ateus.
Sempre coloquei a religiosidade como uma materialidade, mas,
como tudo produzido por pessoas que leem muito, tenho uma visão diferente
agora. Enquanto a religiosidade seria uma ekklasias (comunidade) da unidade da
divindade, a espiritualidade seria a conexão por si mesma com a divindade. A religiosidade
seria a parte coletiva da conexão entre aquilo que é uma consciência cósmica –
como uma consagração das energias sutis dentro da perspectiva coletiva – a espiritualidade
tem a ver com a individualização dessa ligação. Os gregos antigos, ignoravam
essa “re-ligação” que as religiões monoteístas tinham e foram se desenvolvendo,
mas havia uma espiritualidade de respeitar a harmonia cósmica como existência de
uma realidade.
Por isso, sem medo de errar, há um grande engano em ter como
conceito (ou sinônimo), acusar filósofos como sendo um bando de ateus só por
serem filósofos. A origem desse tipo de preconceito sempre fica envolta de
pensamentos moralistas dentro da religião – propagadas por aqueles que não sabem
enxergar os simbolismos – que não agrega para se juntar ao divino (a consciência
cósmica), mas de um modo destrutivo e obrigatório na sua visão. Seria o mesmo
pensamento que matou a filosofa neoplatônica Hipatia, queimou a Biblioteca de
Alexandria etc.
Indo mais além, como a frase de Aristóteles sugere, o mito
como uma outra forma de contar ou teorizar a origem (arkhé) das coisas e do
mundo, não pode ser ignorado. Mesmo em tempos modernos, os filósofos se
utilizaram de formas diversas de mitos (que a modernidade e a pós-modernidade vai
colocar como ídolos ou ideologias) para construir seus conceitos e analisar
mais a fundo certos pensamentos. Néstor Luiz Cordero em seu livro “A Invenção
da Filosofia (ed. Odisseus), disse que “Como Adão e Eva, a filosofia nasceu adulta”.
Ou seja, para explicar uma concepção da filosofia, como sabedoria continua, ele
utilizou de simbolismos dentro da religião judaica.
O philo-sophós é um sujeito que busca a sabedoria por amor, por respeito a verdade
que tanto procura. Um philo-sophós não tem certezas – porque as certezas acabam
doutrinando o conhecimento – se lhe perguntar se a filosofia tem serventia, ele
pergunta: o que é a serventia? Que, aliás,
o simbolismo da serventia tem sido quase como uma praga dentro do pensamento brasileiro
por causa do pensamento positivista (por um lado) e o marxista (por outro lado).
Onde o pensamento intelectual é uma atividade burguesa (ou no caso do
positivismo, a filosofia não seria uma ciência) e que o intelectualismo não serviria
para a classe trabalhadora. Mas aí que esta, analisamos o pensamento de Marx de
perto, pois, ele no ímpeto de defender essa classe se esqueceu que, no muito,
ela é trabalhadora justamente por causa da sua ignorância.
O ser humano, a meu ver, consiste em parte biológica (sentimental
e racional) onde vive dentro da realidade e como enxerga ela (com todas as suas
limitações). Outro lado é o espiritual, onde há dentro de cada um sentido para a
energia (ou centelha divina) desenvolvida com a evolução. Como e o porque, não sabemos,
assim é o papel da filosofia. A verdade da existência é a verdade da essência humana.