"Eu não imaginava
que uma criança que tem 10% do cérebro funcionando fosse tão chata e pudesse me
dar tanto problema. A vontade, às vezes, é de largar na porta do orfanato e
deixar alguém se virar, alguém tomar conta",
(Pai Capacitista)
Já faz alguns anos que uma questão é repetida: vale a pena
tudo por causa de uma curtida? O influenciador, Igor de Oliveira (24), fazia conteúdos
pela internet expondo sua filha com paralisia cerebral, Sofia (2). Acontece que,
Igor para ter engajamento e mais dinheiro, apelava para o sarcástico e para
pedir doações, teria enganado seu publico. Primeiro, em alguns áudios, teria
dito ter comprado um carro e sua ex-mulher teria feito uma operação plástica (hoje
chamado de procedimento estético). Depois, em um ato de querer mais
engajamento, teria proferido falas desse tipo sobre sua filha propagando a desinformação
e desrespeito com deficientes não só pela internet, mas, em todo território nacional.
O blog Vencer Limites nos trouxe dias atras, reportagem de uma mulher com
surdes, negra e analfabeta, que desde sua infância era mantida como doméstica
(em caso de escravidão),
Como é mostrado na frase acima citada pelo G1, a paralisia
cerebral (como a deficiência que eu tenho) não usa 10% da capacidade cerebral. É
uma deficiência psicomotora que afeta a postura, os movimentos e toda e a fala
(bastante lenta). Ou seja, a paralisia cerebral não pode ser tratada como algo
do tipo como usar 10% do nosso cérebro e como não tivéssemos consciência, pois,
se não tivéssemos consciência, não tínhamos o entendimento e não estaria
escrevendo esse texto. O que ocorre – e Foucault já tinha alertado sobre no
livro Os Anormais – existe a cultura do monstro que define o que é e o que não é
normal. E isso começa no século 18 com o meio jurídico definindo o criminoso
como um sujeito com o corpo deforme, o pecaminoso que esta contra as leis
sociais e as leis naturais. E Foucault lança ate uma pergunta: “Qual é o grande
monstro natural que se oculta detrás de um gatuno?” e ele responde: “O monstro
é, paradoxalmente — apesar da posição-limite que ocupa, embora seja ao mesmo
tempo o impossível e o proibido —, um princípio de inteligibilidade. No entanto
esse princípio de inteligibilidade é propriamente tautológico, pois é
precisamente uma propriedade do monstro afirmar-se como monstro, explicar em si
mesmo todos os desvios que podem derivar dele, mas ser em si mesmo
ininteligível.” (Foucault, pag 44 PDF, 2024).
Ou seja, Foucault lança algo bastante emblemático dentro das
premissas estruturais do corpo, pois, o corpo em si é um comunicador também que
precisa ser compreendido. Se alguém não corresponde nessa comunicação (simplista,
por natureza), tende sempre a fazer uma leitura de rejeitar esse corpo e dizer
que aquilo não pode ser humano. Não pode corresponder a capacidade humana de
conter consciência. se cria o “monstro humano” como algo subjetivo de uma
leitura rasa e sem proposito (como esta, por exemplo, na obra O Corcunda de
Notre-Dame de Victor Hugo). O “monstro humano” começa em Roma quanto a lei pater
fazia do chefe da família um juiz, um executor e quem poderia ou não ser
normal. O deficiente é um “monstro humano” por não se adequar aquilo que se
acha ser natural.
Em uma critica bastante rigorosa, poderemos dar razão ao
rapaz quando ele diz: <"O engajamento não vem com a verdade. A verdade
não engaja e a verdade não vende">. A “verdade” não agrada porque temos uma
sociedade que se alimenta das ilusões e acha que aquilo é verdade por causa de
uma imagem, mas, nem sempre uma imagem é verdadeira. Outra coisa importante é
que, fomos educados em que as telas são só entretenimento e não se pode ter um
momento de aprendizado. A verdade não agrada.
A verdade matou Sócrates e Jesus. A verdade não pode nos dar ilusões e sim, a
verdade nos mostra como fomos enganados com ilusões. Como disse Nelson
Rodrigues: “mintam por misericórdia”.
Mesmo porque, se olharmos com bastante atenção o porque ele
atingiu esse nível de doações, tem a ver com a visão assistencialista que ainda
persiste com a questão da deficiência. isso tem a ver – no fundo – com as instituições
que sempre cuidaram das pessoas com deficiência e a alimentação da ideia que
ela é uma doença, e essas instituições, curavam. No caso de deficiências permanentes
como paralisia cerebral, as instituições só podem amenizar as limitações que
elas causam dentro da falta de oxigenação cerebral, porem, não há nenhuma cura.
Mesmo que possamos ter engenharias genéticas – como controle de nascimentos por
vitro – vai haver combinações aleatórias, contingências. A determinação do que é perfeito ou não, tem
a ver com a condição humana de não lhe dar com a incerteza do universo.
Amauri Nolasco Sanches Junior
– Bacharel em Filosofia, publicitário e técnico de informática
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