quinta-feira, 27 de junho de 2024

INFLENCIADOR DO CAPACITISMO

 

 




"Eu não imaginava que uma criança que tem 10% do cérebro funcionando fosse tão chata e pudesse me dar tanto problema. A vontade, às vezes, é de largar na porta do orfanato e deixar alguém se virar, alguém tomar conta",

(Pai Capacitista)

 

 

Já faz alguns anos que uma questão é repetida: vale a pena tudo por causa de uma curtida? O influenciador, Igor de Oliveira (24), fazia conteúdos pela internet expondo sua filha com paralisia cerebral, Sofia (2). Acontece que, Igor para ter engajamento e mais dinheiro, apelava para o sarcástico e para pedir doações, teria enganado seu publico. Primeiro, em alguns áudios, teria dito ter comprado um carro e sua ex-mulher teria feito uma operação plástica (hoje chamado de procedimento estético). Depois, em um ato de querer mais engajamento, teria proferido falas desse tipo sobre sua filha propagando a desinformação e desrespeito com deficientes não só pela internet, mas, em todo território nacional. O blog Vencer Limites nos trouxe dias atras, reportagem de uma mulher com surdes, negra e analfabeta, que desde sua infância era mantida como doméstica (em caso de escravidão),

Como é mostrado na frase acima citada pelo G1, a paralisia cerebral (como a deficiência que eu tenho) não usa 10% da capacidade cerebral. É uma deficiência psicomotora que afeta a postura, os movimentos e toda e a fala (bastante lenta). Ou seja, a paralisia cerebral não pode ser tratada como algo do tipo como usar 10% do nosso cérebro e como não tivéssemos consciência, pois, se não tivéssemos consciência, não tínhamos o entendimento e não estaria escrevendo esse texto. O que ocorre – e Foucault já tinha alertado sobre no livro Os Anormais – existe a cultura do monstro que define o que é e o que não é normal. E isso começa no século 18 com o meio jurídico definindo o criminoso como um sujeito com o corpo deforme, o pecaminoso que esta contra as leis sociais e as leis naturais. E Foucault lança ate uma pergunta: “Qual é o grande monstro natural que se oculta detrás de um gatuno?” e ele responde: “O monstro é, paradoxalmente — apesar da posição-limite que ocupa, embora seja ao mesmo tempo o impossível e o proibido —, um princípio de inteligibilidade. No entanto esse princípio de inteligibilidade é propriamente tautológico, pois é precisamente uma propriedade do monstro afirmar-se como monstro, explicar em si mesmo todos os desvios que podem derivar dele, mas ser em si mesmo ininteligível.” (Foucault, pag 44 PDF, 2024).

Ou seja, Foucault lança algo bastante emblemático dentro das premissas estruturais do corpo, pois, o corpo em si é um comunicador também que precisa ser compreendido. Se alguém não corresponde nessa comunicação (simplista, por natureza), tende sempre a fazer uma leitura de rejeitar esse corpo e dizer que aquilo não pode ser humano. Não pode corresponder a capacidade humana de conter consciência. se cria o “monstro humano” como algo subjetivo de uma leitura rasa e sem proposito (como esta, por exemplo, na obra O Corcunda de Notre-Dame de Victor Hugo). O “monstro humano” começa em Roma quanto a lei pater fazia do chefe da família um juiz, um executor e quem poderia ou não ser normal. O deficiente é um “monstro humano” por não se adequar aquilo que se acha ser natural.

Em uma critica bastante rigorosa, poderemos dar razão ao rapaz quando ele diz: <"O engajamento não vem com a verdade. A verdade não engaja e a verdade não vende">.  A “verdade” não agrada porque temos uma sociedade que se alimenta das ilusões e acha que aquilo é verdade por causa de uma imagem, mas, nem sempre uma imagem é verdadeira. Outra coisa importante é que, fomos educados em que as telas são só entretenimento e não se pode ter um momento de aprendizado.  A verdade não agrada. A verdade matou Sócrates e Jesus. A verdade não pode nos dar ilusões e sim, a verdade nos mostra como fomos enganados com ilusões. Como disse Nelson Rodrigues: “mintam por misericórdia”.

Mesmo porque, se olharmos com bastante atenção o porque ele atingiu esse nível de doações, tem a ver com a visão assistencialista que ainda persiste com a questão da deficiência. isso tem a ver – no fundo – com as instituições que sempre cuidaram das pessoas com deficiência e a alimentação da ideia que ela é uma doença, e essas instituições, curavam. No caso de deficiências permanentes como paralisia cerebral, as instituições só podem amenizar as limitações que elas causam dentro da falta de oxigenação cerebral, porem, não há nenhuma cura. Mesmo que possamos ter engenharias genéticas – como controle de nascimentos por vitro – vai haver combinações aleatórias, contingências.  A determinação do que é perfeito ou não, tem a ver com a condição humana de não lhe dar com a incerteza do universo.

Amauri Nolasco Sanches Junior

– Bacharel em Filosofia, publicitário e técnico de informática

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