”Lutar pelos direitos dos deficientes é uma forma de superar as nossas próprias deficiências”
Minha deficiência não atrapalhou tanto
a minha vida. Quando eu era pequeno, brincava com meus irmãos no
mesmo modo que todo mundo. Eu era um cara que não pensava muito na
deficiência, mas, não quer dizer que eu não percebia as caras de
pena ou o preconceito. Desde 1983 fiz tratamento na AACD (Associação
a Assistência a Criança Deficiente, mas antigamente era
Defeituosa), e todo o procedimento foi lá, até a base da minha
educação. Fiz até a quarta série primaria em uma das unidades da
associação com convênio com o Estado. Acabamos com as classes
especiais, porque não queremos depósitos de pessoas com
deficiência, como ainda existem em cidades do interior e aqui
também. Mas, não sou mal-agradecido e sei, muito bem, que a
associação fez para eu sentar, para eu ficar em pé e ter uma vida
normal. Porém, não foi de graça, meu pai pagou quantias numerosas
para a associação de 1983 até 2000, quando fui desligado de vez.
Como disse, não pensava muito em minha
deficiência, preferia pensar que eu era diferente como os mutantes
dos HQs dos X-Mens. Adorava a figura do anti-herói do Wolverine,
mas, algo sempre me incomodou: o porquê, sou assim e porque fui
sorteado com uma deficiência. Aliás, a paralisia cerebral está
ainda em discussão lá fora, porque muitas crianças nasceram com
falta de oxigênio e não ficam com sequelas depois. O próprio Freud –
pai da psicanálise – quando era médico, fez um trabalho sobre a
paralisia cerebral contestando o senso comum na área, dizendo que é
falta de oxigênio no parto. Freud disse o mesmo que eu escrevi,
existem crianças que faltam oxigênio e não tem nenhuma sequela,
então, ele (Freud) concluiu que poderia ser algo intrauterino. Sim,
estudei muitas deficiências e a minha, foi movida de eu entender ela
e lhe dar com ela. Então, não sou uma pessoa neurótica que fica
pensando como superar as coisas, faço muitas coisas e para mim, isso
é uma coisa normal. Não me acho exemplo de nada. Sou um homem que
gosta o que muitas pessoas gostam, tenho desejos que todo mundo tem e
vou ao banheiro como todo mundo.
Tenho um entendimento do segmento das
pessoas com deficiência e não agrado, exatamente, seu conceito
principal de vitimismo. Porém, eu sei que estamos em um país
capacitista. Mas, por outro lado, o capacitismo só existe quando
você alimenta esse tipo de atitude e isso começa em casa. O
problema – vejo isso desde o Orkut – que muitos deficientes não
tem coragem ou não querem frustrar sua mãe ou seu pai, dizendo um
sonoro: Não! Também tem a questão de apoiar campanhas que
alimentam uma atitude capacitista, que as pessoas com deficiência
dependem da família e vão depender a vida toda. Existem amigos meus
que moram sozinhos. Não fazem tratamento na associação em questão,
não dependem de shows televisivos para viverem. E vivem muito bem.
Eu também não dependo da AACD para nada, faço tratamento no
Instituto Cartão Cristão. Eu e meu pai preferirmos pagar eles, do
que pagar uma associação que falou a vida inteira que meu pé
estava torto, mas, a fisioterapeuta disse que era minha bacia que
estava torta. Abriram meu pé, tive hemorragia porque os pontos
estouraram, aguentei motorista mal-educado, aguentei voluntária
enchendo o saco não deixando nós fazermos nada, e outras coisas.
Então, não doou nada para o Teleton e nada para a AACD.
Outra lenda que todo mundo gosta de
reproduzir é que a associação doa cadeiras de rodas, mentira, o
Estado compra pelo SUS a cadeira e outro aparelho e a AACD faz o
trabalho de entregar a cadeira de rodas. A associação não dá nada
e não doa nada. No tempo que fiquei na unidade da Mooca, aqui em São
Paulo – na Oficina Abrigada de Trabalho entre 1992 até 2000 –
eles vendiam até mesmo, a comida doada que as pessoas doavam.
Vendiam os artefatos doados. Venderam tudo que podiam. Então, nada é
de graça dentro da associação.
Assim, nem todas as pessoas com
deficiência concordam com o Teleton.
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