Por Amauri Nolasco Sanches Junior
A pergunta seria: o que é o amor? As pessoas, escravas da visão romântica vitoriana, dizem que o amor é aquilo que faz que nos ligamos afetivamente ao outro. Mas, eu acho que concordo com Nietzsche em dizer que não amamos o objeto do nosso desejo, na verdade, amamos nossos desejos. Ou seja, a idealização vem do fato que não enxergamos as pessoas como elas são e sim, tudo aquilo que achamos importante encontrar nelas. Mesmo quando é amor de mãe, há uma certa romantização, porque nem todas as mães amam seus filhos ou criam seus filhos por amor, mas, muitas vezes, para ter segurança em sua velhice. Desde então, criam seus filhos de modo “devocional”, para não lhe largar nunca e assim, não sendo um ser humano para o mundo e sim, para si próprio.
Isso para as pessoas com deficiência – principalmente, cadeirantes – isso é um imenso problema. Porque, por um lado a mãe não larga ele (a) (porque foi criada a ser assim), por outro lado, cria no sujeito com deficiência uma dependência bastante devocional e assim, se cria uma figura sagrada. Ou melhor, a mãe se torna algo, divinamente, visto e ele terá que ser agradecido a ela o resto da sua vida por ter aceitado e criado do jeito que ele é. Ora, se é um amor, realmente, incondicional (ou não condicionado a não ter nenhum tipo de condição), por que se deve querer esse amor “devocional” do seu filho e que ele te agradeça ao resto da sua vida? Por um lado há a vaidade (daí vem termos como “mães especiais”) e o outro lado há um sentimento de apego exagerado. Conheci pessoas que só porque a filha deu o primeiro pedaço do bolo de aniversario pro namorado, se sentiram ofendidas, que demonstra um egocentrismo “monstro”. O problema aqui não é o amor em si mesmo – porque, verdadeiramente, pode existir – mas, esse “idolatria” pela sua mãe e a dependência emocional que te faz ser uma pessoa frustrada e bunda mole.
Também existe o amor por outra pessoa, que traz um outro problema que vai ao encontro do pensamento nietzschiano. Se amamos o desejo e não o objeto desejado, as pessoas nunca vão desejar um cadeirante, porque queiram ou não, a cadeira de rodas ficou como sinônimo de doença. Exato. O problema não é a deficiência em si, mas, a cadeira de rodas. Tecnicamente, as cadeiras de rodas não foram inventadas para pessoas doentes, se o hospital tem cadeiras de rodas é para carregar pessoas com alguma limitação de andar. Mas, as cadeiras de rodas foram foram feitas para o transporte de pessoas com deficiência. Talvez, essa ligação com a doença, é o fato que nossa cultura é muito católica.
Não quero entrar na esfera religiosa (porque não é o intuito do texto), mas, o que se pode dizer que o catolicismo por ser romano, se herdou uma visão bastante grega antiga do corpo como harmônico. Pois, antigamente, uma pessoa doente seria um corpo que não era harmonioso e assim, o corpo “defeituoso” era um corpo que não havia nenhuma harmonia. Na idade média, se acreditava – como povos orientais e povos antigos – tudo aquilo que nasce não perfeito (num modo estético) não poderia ter vindo da divindade e sim, do demônio. A ideia do demônio advêm da ideia da desarmonização da natureza divina, que gera, corpos distorcidos e uma imagem não tão agradável do próprio demônio. Porque, para o mundo grego, todos os corpos deveriam ser belos para conter alguma harmonia e quando um ser nascia com algum “defeito”, nem essência ele teria e não poderia exercer nada.
A imagem da cadeira de rodas ficou como um limite, não se pode ter liberdade sem andar – por isso tem tantos pastores prometendo das pessoas andarem – porque não se pode ter liberdade sem ter autonomia. Mas, poderemos perguntar: ué, a cadeira de rodas em si, não daria uma certa autonomia para a pessoa? Ai que está, a imagem da deficiência e da doença se encontram no fato de pessoas sofrerem. O sofrimento vem da palavra “pathos” em grego, que é o mesmo de paixão. Então, quando ficamos doentes não temos uma patologia? Nós não sofremos? E não pensam que a deficiência é uma doença? Essa imagem da cadeira de rodas como uma prisão, é uma visão limitada do sofrimento enquanto não autônomo.
Dai, como dois sofredores, podem ficar juntos sendo que não podem andar ou serem autônomos? Como vão se virar? E isso não parte só dos que não tem deficiência ou da família, existem cadeirantes, que dizem querer arrumar uma pessoa sem deficiência para cuidar deles. Será que querem uma companheira ou querem uma enfermeira? Não há nenhum problema quanto a isso, pois, cada um escolhe faz ou não o que as pessoas querem. Mas, isso endossa a sociedade e pode trazer coisas bastante ruins pela frustração de ter uma pessoa não porque você gosta dela, e sim, porque a sociedade te convenceu que a imagem deles é a certa.
Um complemento do texto:
Bom dia, eu sou bipolar e miaatenica e realmente quando pessoas "normais" descobrem, deixam de ter interesse em mim. Há muito preconceito, a sociedade não aceita o deficiente em nenhuma esfera, seja o cadeirante, seja o de transtorno mental, nos limitam, nos olham com pena ou aversão muitas vezes. Teve um rapaz que desistiu de mim devido as duas patologias, a desculpa dele foi dizer que pertencemos a mundos diferentes. É complicado.
ResponderExcluirmuito obrigado Janaina pelo seu depoimento...mas, o mundo é assim, se faz uma imagem dele que não existe
ExcluirBom dia, eu sou bipolar e miaatenica e realmente quando pessoas "normais" descobrem, deixam de ter interesse em mim. Há muito preconceito, a sociedade não aceita o deficiente em nenhuma esfera, seja o cadeirante, seja o de transtorno mental, nos limitam, nos olham com pena ou aversão muitas vezes. Teve um rapaz que desistiu de mim devido as duas patologias, a desculpa dele foi dizer que pertencemos a mundos diferentes. É complicado.
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