Nesses dias assistindo a seria O Samurai de Olhos Azuis (da Netflix)
me deparei em uma nova proposta de animação e numa nova maneira de construção de
animação. Ora, quem sabe um pouco de gráfico (por eu ser publicitário também)
com certeza os gráficos foram feitos por computação gráfica. Mas, a história é
muito bem construída e mostra um Japão invadido por europeus gananciosos no século
quinze e dezesseis, que não queriam só comercializar suas especiarias, mas,
queria também dominar o oriente (como acabaram fazendo com o capitalismo ocidental).
Isso também é mostrado na série Shogun (que ainda não vi).
Mizu é um espadachim habilidoso e achava que só isso bastava
para ser um samurai. Por ter nascido de olhos azuis em um Japão que não queria
ser colonizado – quem quer? – foi sempre hostilizado como uma aberração (como,
recentemente, se descobriu que olhos azuis é uma anormalidade do ser humano). Mas,
também, era fruto de uma violência contra sua mãe por um europeu britânico e
era uma menina, porém, sua mãe a criou como um menino. Sem spoiler (vejam a
serie na Netflix), vamos ao foco do texto: a verdade. será que a vingança de
Mizu era uma verdade universal ou subjetiva?
No livro O Problema da Verdade de Jacob Bazarian – um livro
que estou lendo em e-book no notebook – ele explora a questão da Teoria do
Conhecimento. Então, no primeiro capítulo, ele faz a seguinte pergunta: <<Qual
o motivo determinante dessa aspiração natural ao conhecimento?>>, pois,
segundo ele <<Aristóteles considerava que o desejo do saber, a
curiosidade espontânea para o conhecimento é inato do homem, isto é, inerente à
natureza humana. Ele afirmava que “ foi a admiração que moveu os primeiros
pensadores às especulações filosóficas”>>. Mas, ficaremos na pergunta,
pois, faz parte sobre a Mizu e sua vingança sobre seu nascimento. Por que temos
a aspiração de conhecer a realidade e curiosidade de conhecer mais?
Mizu por estar numa posição de “diferente” – porque não existia
japonês com olhos azuis – ela se sentia menos e tinha que aprender a arte da
espada para se sentir grande. Só que um samurai (mesmo Ronin) não era só a
katana, mas, também teria que aceitar o preceito da honra que faz parte do bushido.
O bushido é literalmente “o caminho do guerreiro” que seria um conjunto de código
de condutas e o modo de vida de um samurai (muito parecido com o Código Jedi da
saga Star Wars). Muito parecido com o conceito do cavalheirismo (dos cavaleiros
medievais), o bushido define alguns parâmetros para os samurais viverem e
morrerem com honra. Tem origem de um código moral dos samurais, enfatiza
frugalidade, fidelidade, artes marciais, mestria e honra, até mesmo a morte
(muitos optavam o suicídio do que ser capturado). O código moral foi
influenciado pelo budismo, xintoísmo e confucionismo, o bushido foi um código que
moldou toda a casta guerreira japonesa por séculos. Mesmo os ronins (samurais
sem clãs ou mestres).
Mizu só descobriu isso após Ringo – o cozinheiro sem as mãos
– dizer que ela não era um samurai de verdade, pois, não tinha honra. Só queria
uma vingança, mas, Ringo queria ser “grande” e tentou outro mestre (que
praticamente, criou Mizu). O “pai das espadas” era cego, mas muitos o
procuravam para fazer suas katanas e o fazia como ninguém. Como? O tempo da
martelada. Conhecer o som era importante para saber como fazer e moldar a espada,
como um limiar de uma vocação. Ringo, sem as mãos, era um cozinheiro habilidoso
e fazia macarrões como ninguém. Mas, gostava da ideia de se transformar em um
guerreiro, que na visão dele, era ser “grande”. Nesse caso, conhecer é superar
dificuldades de que nos encontramos. Por eu andar numa cadeira de rodas, sei como
rodar as rodas e tomar o controle. Tem pessoas que se sentam em uma cadeira e não
sabem.
O conhecimento tem a ver com a realidade (aquilo que a consciência
capta) e então, talvez, possa ter uma realidade objetiva (que existe independente
da sua consciência) e uma realidade subjetiva (que existe dependente da sua consciência).
Mizu poderia ter relavado os bullyings que sofreu, o que sua dor fez foi moldar
seu caráter em vingar e querer matar seu pai biológico. Ora, a dor fez outra
coisa, fez com que ela aprendesse a arte da katana, ser um samurai ronin, ser
habilidosa em alguma coisa. Como Ringo pode amarrar sua faca no final do braço
(no lugar da mão) e cozinhar, como o “pai das espadas” e com o barulho da
martelada saber o tempo certo de cada modelagem. A questão que nesse intuito,
sempre teremos que aprender a nos adaptar dentro daquilo que nos adaptamos
melhor.
Platão no diálogo Teeteto, Sócrates inicia o diálogo com a
pergunta: “O que é o conhecimento?”. Será que essa pergunta tem resposta? Nesse
diálogo, tudo gira na frase de Protágoras (sofista) que dizia que “o homem é a
medida de todas as coisas”. Platão pergunta através de Sócrates como um
problema: estamos falando do homem como individuo ou como espécie? Mesmo porque,
o objetivo de Platão é a alma, pois, em sua crença, o mundo em que o corpo está
é um teatro de sombras (como no Mito da Caverna). Porque, enquanto olhamos as
coisas e nos enganamos, podemos fechar os olhos e nos voltar para nós mesmos
(conhecer a si mesmo), para nossa alma. Onde Platão diz que está a realidade. Ou
seja, o filosofo grego nos diz que devemos abandonar a experiencia (o sensível).
No platonismo, a alma seria o conhecimento, pois se baseia em aspectos
universais, por outro lado, o corpo seria a doxa (o que falam de...).
Não podemos deixar de comparar o platonismo (que veio do
lado mais místico do pitagorismo) com preceitos budistas. Mas há uma diferença:
para Platão há uma realidade superior e que tudo pode ser ilusão, para Buda a ilusão
não é ruim. Ela só é vazia. Por isso o não apego aquilo que não somos nós,
porque aquilo não nos pertence e é impermanente. Mizu se iludi que matando seu
pai vai trazer paz, mas sem essa ilusão, Mizu era só mais uma mulher usada e hostilizada
por ter olhos azuis (uma aberração). Sem a ilusão Ringo era só mais um
cozinheiro. Buda, assim como Jesus Cristo (um homem são não precisa do medico),
mostra que a ilusão (assim como o sonho) não vai durar para sempre, um dia
acaba e voltamos para o real. Platão diz que o corpo é a prisão da alma.
Nesse caso, o conhecimento (episteme) tem a ver com aquilo que
queremos saber para ter certezas, ter certeza que somos humanos e não seres
aberrantes ou não humanos. Os olhos azuis de Mizu fez ela superar a condição ilusória
de tradições milenares que as mulheres não teriam habilidades, não teria meios
de guerrear e buscar sua meta. Mesmo que essa meta é a morte do seu pai, que
acredita, gerou a sua dor.
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