Amauri Nolasco Sanches
Júnior
"Se não
está nas tuas mãos mudar uma situação que te causa dor, podes sempre escolher a
atitude com que enfrentas esse sofrimento." - Viktor Frankl
Tenho muitos textos aqui no blog sobre deficiência,
exatamente, por eu ser um deficiente – foi o nome de um outro blog da Wordpress
que esqueci a senha e perdi o blog – por viver o fenômeno da deficiência como
uma condição dentro das limitações do meu corpo e isso não foi uma questão que
me levasse a se matar (como muitos colegas) e ter ódio da deficiência. Confesso
não ser um tema que eu debruce nele e estude como matéria filosófica e como
estudo fenomenologia e ontologia (também antropologia filosófica), poderá no
futuro ser um tópico importante dentro de um estudo mais sistemático.
Mas o que levou a esse texto? Porque uma amiga disse que poderia
ser um coaching – na verdade, filósofos não são coaching, são aqueles que jogam
a verdade e mostram que na essência, o que temos como certeza são só
determinação da nossa subjetividade – e que poderia juntar o que eu sei de
filosofia e o que eu sei da deficiência. A deficiência eu vivo (como fenômeno
da existência) e a filosofia eu estudo (como um conhecimento adquirido). Mas,
vendo o podcast Aderiva (com o Arthur Petry) da mãe de um menino TEA
(Transtorno do Espectro Autista) que disse que odiava o autismo (odiamos aquilo
que não entendemos) me fez refletir o que minha amiga disse, já que minha amiga
vive a deficiência.
Existem dois ramos que filósofos da deficiência (ou
filosofas feministas da deficiência) colocaram na filosofia da deficiência (e
sim, existe a filosofia da deficiência): primeiro a ontologia e segundo a
fenomenologia. A ontologia é um estudo do “ser enquanto ser”, ou seja.,
poderemos dizer que seja um estudo das essências dentro das coisas e dos corpos
e seres que exigem uma essência para existirem (seria o que Aristóteles colocou
na obra Metafisica). Já a fenomenologia, ou melhor, o fenômeno da existência
dentro da capacidade de adaptar e perceber a deficiência de uma certa situação.
Ou melhor, ser um deficiente (ou um corpo divergente) que tem que se adaptar
para a vida. O que seria “se adaptar para a vida”? Porque a deficiência – de
(negação) eficiência (aquilo que é eficaz) – é o corpo não eficaz em algo e
esse algo, não é o ser em sua natureza,
mas é o ser em sua condição de não eficácia de movimentos, de não percepção da
realidade ou a não materialização de sentimentos ou consciência da realidade. Porém,
com tudo, um corpo humano, descendente do mesmo ancestral do ramo hominídeo.
Mas, o corpo – que poderíamos chamar de Coisa em si – tem aquilo
que percebemos e aquilo que somos. Quando o outro não nos deixa perceber quem
somos, tendemos querer eliminar o ser-outro que não deixa encontrar o ser-eu em
estar no mundo. A coisa em si vem do modo kantiano de pensar e quer dizer
aquilo que existe independente da percepção, eu sei que no meu quintal tem um pé
de manga, por exemplo, porque meu pai disse que esta carregada de flores. De
onde eu fico não vejo, mas a “coisa em si” do pé de manga existe. No caso do
corpo – enquanto coisa extensa da existência – é mais do que mera aparência,
seria a essência, presença, existência concreta. Aquilo que existe e faz eu
dizer que “sou”.
Odiamos aquilo que nos incomoda enquanto ser egoísta que
somos – a mãe mesmo confessa ser egoísta – por sermos animais sociais para
mostrar ao outro e não a nós mesmos. O objeto do desejo do prazer de conversar –
no caso dela, a prima de longe – transcende o querer e passa a ser uma imposição
social, como uma lei que quero e preciso. Mas, como diria o existencialismo de Sartre,
escolhemos nossas vidas e muitas vezes, não nos responsabilizamos a nós mesmo
de ter escolhido essa vida. Como diria Sartre, temos a liberdade de escolher,
mas ao mesmo tempo, temos responsabilidade das nossas escolhas. Nesse caso, a
culpa recai no autismo. Ou em outros casos, a culpa recai na deficiência.
Daí vem a pergunta quase existencialista: como alguém tem ódio
de uma condição? Como alguém acha que o filho com deficiência tem que ser
trancado ou tem que estar seguro? E assim, passamos para o ser-Eu (em inglês self)
em o ser-Outro (Other). Como um ser-Eu com um corpo divergente – de-eficiente –
ou como disse, aquilo que percebemos (a deficiência) e aquilo que somos (eu
sou) posso dizer que, classes especiais não são seguras assim. Mas indo mais além
do corpo, há uma distinção entre o corpo como objeto percebido (eu e o outro) e
o corpo como sujeito vivido – como que sente, age, sofre e deseja. Isso é bem
central na fenomenologia. Ora, quando o outro passa a nos definir, quando nos rotula
ou impede de nos expressar totalmente, ele passa a interferir na nossa
liberdade de ser. isso é uma forma de “objetivar” o ser-Outro como um objeto da
nossa vontade,
A vontade. O desejo de eliminar o ser-Outro – não literalmente,
mas de modo simbólico – é uma provocação no sentido da reflexão do papel do
outro na nossa vida. Ela mostra a vontade de ter uma vida “normal”, passa a ser
uma vontade imposta pela moralidade social que achamos estar em negação do
nosso ser. dai poderemos desenvolver um impulso destrutivo, não só de eliminação,
mas de calar tudo aquilo que me impede de ser massificado.
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