sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Os Golfinhos e Paradoxo de Epicuro

 



Amauri Nolasco Sanches Junior

O filósofo Luiz Felipe Pondé escreveu um dia que até um golfinho seria ateu, e as pessoas não entenderam o que ele queria dizer com isso. Ora, como um bom nietzschiano - como base de sair do pensamento comum - as pessoas não chegam a refletir tanto na crença de acreditar em alguma divindade ou não. A meu ver, o ateísmo - mais especificamente, o ateísmo militante - não passa de uma crença de não existência em Deus e que considera que o mundo e toda a realidade se veio do nada. Duas coisas - antes de comentar o Paradoxo de Epicuro - o que seria realidade e o nada.

Umas das perguntas mais importantes da filosofia, hoje em dia é: por que o ser e não o nada? Pois, na filosofia há uma relação entre a realidade e o nada como um tema importante, por ser um assunto complexo e muito debatido ao longo da história. Mesmo o porque, o nada é um conceito que está presente na intersecção da ciência, da filosofia e na linguagem (como meio de dar forma aquilo que pensamos). Alguns filósofos, argumentam que que o nada não passa de um termo, não tem significado algum dentro de qualquer linguagem e não é um ser (algo real). Eles argumentam, que o nada não pode existir, pois a própria ideia (forma) que damos a nada implica a algo, mesmo que seja a ausência de algo. Um exemplo muito claro é quando pensamos em nada, estamos pensando em algo, mesmo que seja a ausência de qualquer coisa. É somente uma construção mental.

Mesmo como construção mental - como a idea de uma conotação mais na essência do termo grego - o nada passa a ser um conceito de coisa nenhuma, algo que na concepção de alguns passa a ser o vazio. Ora, nem mesmo na matemática o nada ou o vazio pode representar um vácuo (que seria a ausência de tudo). Mas, será mesmo que existe essa ausência de tudo? Existem filósofos, por exemplo, que fazem uma defesa de que a existência do nada é um conceito válido. Pois, o nada seria uma parte muito fundamental dentro da realidade e faz o filósofo compreender muito o mundo. Isso é muito importante dentro da ontologia e da metafísica, explorando a natureza do ser e da existência.

A relação entre a realidade e o nada também pode ser concebida em termos de criação e destruição (como o deus hindu Shiva que pode criar e pode destruir). Alguns filósofos argumentam que a realidade é criada a partir do nada - muitos cientistas ateus também - enquanto outros pensadores defendem que a realidade é a negação do nada. Ora, essas perspectivas podem refletir várias interpretações sobre a origem e a natureza da realidade. Sem essas explicações não seria possível responder o “suposto” Paradoxo de Epicuro.

Apareceu essa versão do Paradoxo em um grupo:


*DEUS está disposto de prevenir o mal,mas não é capaz?

Então ele não é onipotente.

*Ele é capaz mas não está disposto?

Então ele é malévolo.

*Ele é capaz e está disposto?

Então de onde veio o mal?

Ele não é capaz nem está disposto?

Então porque lhe chamamos de Deus?



Segundo a Wikipedia, existem dois problemas: uma que muitos historiadores dizem que na verdade, foi Carnéades (filósofo cético) que tenha dito tal paradoxo. Segundo o estudioso alemão Reinhold F. Glei. estaria claro que o argumento teodiceico é de uma fonte acadêmica não epicurista, mas até talvez anti-epicurista. Uma versão muito bem preservada deste trilema aparece nos escritos do cético Sexto Empírico. Ainda no mesmo artigo da Wikipédia, Charles Bray, em seu livro A Filosofia da Necessidade de 1863, cita  o paradoxo sem mencionar sua fonte do mesmo trecho que eu coloquei ali em cima.

Agora vamos ao outro problema, Epicuro (e nem os epicuristas) eram ateus e não acreditavam em uma divindade. Isso foi propagado por fontes cristãs católicas por causa da filosofia de Epicuro do prazer, só que ele não ensinava a ter prazer desmedido como queria crer os padres (com a ideia do prazer carnal). Só que se comemos sentimos prazer de comer, se bebemos sentimos prazer em beber, se defecamos o prazer do alívio é imediato. Não existe so o prazer do sexo (que é sim uma necessidade) e nem das causas mórbidas - olha ai a ideia do cenobitas de novo - e sim, Epicuro dizia que teria que ter equilíbrio entre o prazer e a dor. Se comer demais vai ter dor e tudo que é demais é dor e miséria. Bem parecido com Aristóteles.

E, a meu ver, existe um outro problema: se fosse mesmo de Epicuro, qual deus ele estaria falando? Mesmo o porque - sendo honesto como todo filosofo deve ser - Epicuro nasceu muito antes do cristianismo ou conheceu o deus judeu Yavé. Contudo, há de se dizer que o paradoxo - esse que eu coloquei no texto - foi modificado e pode gerar confusão. Mas, ao que parece, é o que temos para analisar.

1 - Seria Deus desejoso de prevenir o mal mas incapaz?


Essa pergunta tem alguns elementos bastante controversos que vão muito contrário a história da filosofia, pois, ao perguntar sobre o desejo (consequentemente, a vontade de Deus), está perguntando coisas bastante complexas. Por outro lado, o paradoxo, conhecido também como “Problema do Mal”, é um dilema filosófico clássico. Aprendemos que a filosofia não perguntaria se Deus fosse desejoso de prevenir o mal fosse capaz, mas perguntaria: o que é o desejo? O que é a incapacidade? Porque um mal - seja lá qual for - tem a ver com o julgamento moral que fazemos com tal conduta. Como matar - uma condição moral universal - que para roubar alguma coisa pode ser má, por outro lado, para se defender ou por causa de uma guerra pode ser o bem de uma nação.

A questão ultrapassa muito mais o dilema moral de fazer e não fazer do que o mal como entidade concreta. Daí a resposta no dilema filosófico: “Portanto não é omnipotente”. Como se sabe se ele não é “omnipresente”? Qual razão poderia achar que Deus poderia interferir nas ações humanas? Dizem os ateus que ele teria o poder de impedir o mal e o sofrimento, mas não há qualquer ação para acabar com esse mal e assim, vamos a segunda pergunta.

2 - Seria ele capaz, mas sem desejo?



Aí vem a segunda resposta: “Então é malévolo”. Há um problema nessa resposta, porque se Deus “malévolo”, ele não pode ser bom. Bondade e maldade pode ser algo sim subjetivo, mas indo muito além na questão do senso comum (como certo ou errado), o bem e o mal pode ser encarado como conhecimento e ignorância. Poderemos ainda dizer que existe um livre-arbítrio que Deus pode ter dado ao homem para ver onde ele vai. Então, poderia ser uma escolha de dar ao ser humano liberdade.

3 - Seria ele tanto capaz quanto desejoso? Então por que há o mal?


A terceira pergunta é uma pergunta moral. Se Deus deseja e é capaz de acabar com o mal (ou ignorância), o porque o mal existe? Algo existe porque saiu da condição de potencialização - partindo da definição aristotélica - para a condição de ato. A bondade de um ato humano tem a ver com a maldade do ato humano, como vontade de fazer ou não, um mal para o outro. Mas, o ato em si mesmo, tem além da racionalização o fator de sentimentalização, por mais que tentamos ser muito mais racionais, somos também sentimento e sentimos raiva, que leva ao ódio e o ódio leva ao ato malévolo.

Isso eximiria Deus do ato humano, porque o humano fez o mal e Deus (por ser bom e justo) tenderia em entender que a moral humana deveria mudar. Nós humanos - como seres racionais, morais e éticos - sempre temos tendência de jogar aos outros o que fazemos. Ora, Sartre (no livro As Quatros Paredes), diz: “o inferno é os outros”, ou seja, a culpa é de Deus e não da própria humanidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário