quarta-feira, 30 de março de 2022

Magalu e Aristóteles – Onde está nossa ética?

 




Ética tem a ver com empatia, mas, ao que parece, não somos uma cultura que gostamos de ética. Para os gregos na antiguidade, a ética (ethos) tinha uma áurea de alma social do povo grego e sua cultura única, tanto é, que quando se criou a filosofia (em cima dos mitos homéricos que eram a identidade do povo grego), era um termo de amizade, ser amigo da sabedoria e ser amigos nesses tempos, era ser amante também. Ou seja, se era amante e amigo do saber, do descobrir a realidade e viver dentro da sociedade – que era um corpo só – dentro do orgulho de ser um grego, mesmo, que esse grego vivesse numa parte pobre. Portanto, ser ético e estar embutido dentro do lado espiritual do povo grego, estar em sintonia dentro de cada polis (cidade-estado) e assim, se for preciso, defender aquilo que é certo. Por que por muitos séculos, esse tipo de sociedade – sem um governo central – eram unidos quando era a questão de defender seu território? Será que encontramos uma ética comum?

O curioso é que depois de Sócrates de Atenas – que também foi soldado – ter se tornado um grande amante da sabedoria, e, combativo dentro da racionalidade de saber a verdade. A verdade é uma escavação daquilo que se chama realidade. A imagem da realidade que temos, são objetos concretos e percepções das forças da natureza que agem no nosso corpo. Sócrates percebeu, talvez, que percebendo a nossa consciência e percebendo a nossa ignorância diante ao mundo e a realidade, vamos conhecer essa realidade e perceber a nossa consciência perceptiva de uma realidade além. Então, para os gregos, ser amigo da sabedoria é ser amante de conhecer a realidade e aquilo que nos une como sociedade, a ética (ethos). Talvez, Aristóteles tenha compreendido isso muito mais do que seu mestre, Platão. A sociedade grega poderia brigar entre si – com as guerras entre as polis – mas, uma coisa poderia unir toda ela em uma só ressonância e isso se chamava phronesis. O termo grego é traduzido como prudência, porém, não se tem um termo em português exato. Deixaram como prudência.

Parece que podemos dizer, que o mundo moderno esquece dessa ética em nome de uma liberdade e conhecimento, num modo geral, que ainda não temos na nossa totalidade. Mesmo com a internet, o conhecimento e a liberdade foram levados para um lado antiético, para um lado que desune muito mais do que une. Aliás, todo o processo de desmonte tanto da essência do ethos como da própria filosofia, começa no império romano. O imperador para manter uma união, tem ou não, de manter a ignorância? O poder em essência, gosta de questionamentos? Talvez, alimentando a individualidade – que começa com os soldados – se tenha uma desunião para melhor governar. Governos alimentados com a ideia do pão e circo, são melhores de manipular, são melhores de enganar. E quando precisou da união para combater as tribos germânicas invasoras, não se teve.

Porém, o estrago já tinha sido feito. A idade média vai ser construída por uma individualidade para receber a graça de Deus, bem parecido com práticas nórdicas que o “pai de todos” – Odin – escolhe cada um conforme sua batalha. Mas, o porquê os antigos sabiam disso e nós perdemos isso? Porque, esquecemos que somos parte de um todo e os antigos sabiam disso, pois, os antigos sabiam que você vende algo e o seu nome estará mais confiante de vender uma outra coisa. Trazendo para hoje, podemos notar que os 300 espartanos não foram lá em Termópilas para se aparecerem ou para terem curtidas – ganharem mais e serem reconhecidos – eles foram porque tiverem que defender a Grécia do rei persa, Xerxes, que queria vingar o pai e conquistar os mares gregos. O rei Leônidas poderia se vender, poderia ser o senhor grego e dominar Atenas, mas, escolheu aquilo que acreditava, que mesmo em rivalidade, a liberdade era mais importante. A honra era mais do que uma individualidade, era a união daquilo que poderia ser com que não poderia ser. Os gregos tinham a sua ética a defender, seu nome a zelar e a confiança de ser o que eram, um povo, uma iniciativa quase voluntaria de defesa.

O que vimos hoje é um mundo desunido e obcecado por um reconhecimento de si, todo mundo quer levar “vantagem” em cima do outro. Pior ainda, usa o nome de outro e o outro mesmo sabendo, não toma providência porque é mais fácil dizer que foi vítima. Golpes tem no mundo inteiro, mas, só no Brasil temos um capitalismo acomodado, um capitalismo que se vitimiza e não toma nenhuma providência. Talvez, foi bom olhar o ser humano como um indivíduo, o problema, que quando nos individualizamos esquecemos que somos uma sociedade humana e isso nada tem a ver nem com ideologias (liberalismo) e nem com o capitalismo, tem a ver com a moral vigente. Nos esquecemos da ética grega graças aos romanos – que queriam sustentar seu império – e assim, esquecer da união intrínseca de um povo e seu ethos. A alma social, a ligação do eu com a realidade. Eu sou o cacto, o cacto é eu. Se eu errei em deixar as pessoas usarem meu nome, é eu que devo me responsabilizar das coisas que deixei acontecer. Estou prejudicando a sociedade, assim, estou prejudicando a minha própria realidade. Como dizem, uma hora “a água vai bater na nossa bunda”. Ou seja, o problema vai vir para nós, e nós vamos ter que resolver, como todo mundo.

Causa e efeito.

Amauri Nolasco Sanches Júnior




 

segunda-feira, 28 de março de 2022

O tapa de Will Smith e a ética da defesa

 




Na cerimônia do Oscar 2022, o ator Will Smith perde a cabeça com o humorista Cris Rock e foi ao palco e deu um tapa na cara – não um soco como disse alguns veículos de imprensa no Brasil – porque, Cris tinha contado uma piada da esposa de Smith. O que ele deveria ter feito além daquele tapa? O tapa não foi forte, ao que parece, só foi um aviso para o humorista parar de fazer certos comentários sobre a condição que se encontra Jada. Justamente, na mesma noite, Smith irá ganhar o Oscar de melhor ator num filme de um pai que defende sua família, defende as filhas do preconceito. A ética nos manda – diria Kant – a defender o princípio básico de uma tão falada frase cristã (que vem de uma sabedoria muito mais antiga), não faça com os outros, o que você não quer que faça com você. Ou seja, e se fosse o Cris Rock com alguém que ele ama? O amor faz com que estejamos acima do bem e do mal, porque a questão essencial dele, é pegar aquilo que somos e potencializar ao ponto de nos dar forças para defender as coisas importantes. Isso nada tem a ver com a libido, tem a ver com que aquilo que foi feito ou falado.

Todo mundo vem escrevendo que é contra a violência, mas, a violência, ainda, vem da nossa natureza primitiva da preservação.  Impulso que nos dá uma razão intrínseca de viver e se você vive no medo – como os filósofos zen nos dizem – o medo te domina e o ódio reina. A famosa fala do mestre Yoda no Star Wars, onde ele diz, que o medo nos leva a raiva e que leva o ódio e o ódio nos leva ao lado negro da força, é zen budismo. Mas, há uma diferença em ódio e o impulso, porque o impulso faz de você um ser dentro de uma realidade. Ali, no caso do Will Smith, não foi o medo de ser agredido, é a ofensa de não respeito e não empatia. A empatia faz nós sermos seres humanos e não seres não racionais, e se não há empatia, não há racionalidade. O pré-conceito não é o conceito, um conceito primário é uma ligação de um mundo ilusório, um “eu acho”. O “eu acho” tem extrema ligação com “tu deves”.

O “eu acho” expressa aquilo no nosso egoísmo instintivo de preservação em opiniões que não são conhecimentos, porque estão ligados no “tu deves”. A normalização de certos discursos, deixam o ser humano amarrados em prisões psicológicas e sociais que não consegue sair. Fora que existem prisões ideológicas, prisões religiosas e prisões de conceitos sociais. O “tu deves” sempre é aquilo que devemos ser para os outros e não, ser para si mesmo. Meditar numa pedra sozinho – assim dizem – é um comportamento estranho e não tem nada a ver com quem somos, mas, a maioria se engana, porque o ato de meditar numa pedra, em cima dela, tem a ver com o que sou. O “quem sou” é a conexão entre quem construiu o ser (ser social) e aquilo que somos (quem sou), fazendo o caminho de descoberta daquilo que deveríamos ou devemos buscar. A verdade que a filosofia antiga dizia, está ai. A conexão entre eu e a realidade transforma em verdade, quando descobrimos que a realidade é uma ilusão. Não podemos definir e nem controlar a realidade.

Talvez, Will Smith se viu entre o “tu deves” dentro da Academia de Cinema, e o “quem sou” que era a defesa da sua esposa. O que era mais importante naquela realidade? O que poderia sentir se uma pessoa que você ama estava sendo agredida? Uma coisa é usar máscaras sociais e achar que o mundo ficaria melhor sem brigas – que também acredito – outra coisa é você defender alguém que foi agredido por causa de uma aparência física. São coisas que só o amor, explica.

Amauri Nolasco Sanches Júnior 

domingo, 27 de março de 2022

Meu amigo Freud e o gado virtual






 Freud foi meu primeiro autor de não ficção que eu li a muito tempo atras – eu tinha uns 10 ou 11 anos de idade, não me lembro – onde eu peguei os livros do meu pai e a minha mãe e comecei a ler (teve um que eu não pude ler na época). Li Tarzan, li um de ficção cientifica (que nunca lembro do nome) e li um do Dr Sigmund Freud, que era do meu pai (diz minha mãe, que ele tinha aquele livro por anos). Depois de muito tempo – e de muita humidade – ele se perdeu por ter mofado junto com outros livros que marcaram minha infância e foi o começo de uma questão que descobri desde muito cedo: eu queria ser escritor, escrever era o que eu gostava e gosto bastante. Com a internet e a filosofia, me descobri um escritor de vidas cotidianas e vidas reflexivas que torna muito mais difícil, porque nossa cultura é avessa a reflexão e um pensamento próprio. A grande maioria gosta de seguir os outros, pensar igual os outros, ser igual os outros e fazer o que os outros gostam. Acho que é porque – isso me intriga desde muito novinho – a grande maioria não é notado, são anônimos o tempo inteiro e quando tem chance de serem notados, começam a gostar disso e fazem de tudo por essa – suposta – notação. A famosa curtida (like).

Freud no seu livro “O mal-estar da civilização” tenta responder a famosa frase “o homem é o lobo do homem”, aonde ele vai até o estabelecimento das leis morais até mesmo, como as formações sociais e familiares, moldaram essas determinações morais. Claro, com o que se tinha na época. Mas, a explicação psicanalista dele é muito interessante e até faz um certo sentido, porque é o que percebemos dentro da sociedade, até hoje. A única diferença são coisas morais que houve mudanças e essas mudanças fizeram as pessoas terem uma outra visão, do casamento, dos filhos etc. por outro lado, a liberdade de dizer e fazer o que quiser não deixou o ser humano de hoje, mais feliz. Aliás, desconfio das pessoas que dizem ser felizes. Isso quer dizer que os iluministas estavam errados? Que não podemos ser felizes só com o conhecimento? É possível, que só o conhecimento, não seja um atrativo dentro da felicidade humana. Porque nem todo conhecimento, pode e é, verdadeiro. Ou seja, caímos de novo na questão grega – leia-se, filósofos gregos – sobre a verdade da realidade e não só o conhecimento. Conhecer é um exercício de olhar para si como uma consciência que percebe e depois olhar para os objetos.

Os objetos – junto com a realidade – são termos que dissemos em todo momento. Uma caneca só é uma caneca porque as características particulares dela, se ligam dentro daquilo que chamamos de caneca, pois, nas várias culturas e os nossos antepassados, deram o nome desse objeto de caneca. Poderia ser outro nome, mas, de uma forma – que não sabemos o porquê – aquilo com uma alça e tem um recipiente acoplado com ela ter chamado de caneca. Mas, poderíamos perguntar: e os objetos que não estão no mundo imanente? Esse texto, por exemplo, são signos (letras) que querem transcrever aquilo que eu penso da realidade, mas, no mundo ele não existe. Podemos dizer que ele é uma virtualização de um texto e uma virtualização do meu pensamento, porém, ele não descreve todo o meu pensamento. As coisas parecem verdadeiras, mas, elas são uma parte dessa verdade imanente dentro do tempo e no espaço. Do mesmo modo, codificações descrevem regras morais para melhor controle da sociedade.

Não é diferente da teoria das sombras de Platão e nem mesmo – porque teve uma base da caverna platônica – o que mostra o filme The Matrix, onde pessoas para manter as máquinas, tem que sonhar por toda sua vida. Só que essa realidade não existe, pois, é uma realidade fabricada para o ser humano viver e gerar energia que as máquinas tanto precisam. A analogia tem um fundo de verdade, porque cada imagem tem uma codificação e codificação é uma linguagem, tudo é uma linguagem, mesmo dentro da evolução da natureza. Não a toa, o apostolo João vai usar “verbo” para dizer que no princípio era o verbo e o verbo era Deus. Tudo é linguagem e tudo é informação. Recebemos milhões de bits de informações do universo (realidade), e nem ao menos, percebemos. Por quê? Uma das explicações é que se acostumamos com as imagens que vimos e convivemos, outra é que recebemos a toda hora e assim, não temos como perceber.

Isso nos faz refletir sobre o papel de tudo isso dentro de uma vida, ainda que, as coisas não são como gostaríamos. A evolução adapta aquilo que é melhor para o organismo, as coisas vão mudando e as culturas e regras morais mudam, mas, sempre o ser humano buscara a felicidade e não vai achar. Porque a felicidade tem a ver consigo, o encontro da verdade é em primeiro lugar, com você mesmo. Então, nossa consciência é a “porta” para vivemos a realidade que nos rodeia? Será que entendendo a nós mesmos, poderemos entender a realidade? Os platônicos – assim como os matemáticos – achavam que o universo é construído dentro de códigos matemáticos. Ou seja, podemos dizer que o mundo virtual não tem muito de diferente de uma realidade imanente, portanto, se no computador existe o negativo (0) e o positivo (1) o universo também tem. Claro, se fomos bastante longe, podemos dizer que sim, há uma codificação em tudo. E mais, nessa codificação existem as proporções certas e proporções exatas matemáticas. Estamos lhe dando com linguagem o tempo todo.

Você pode perguntar: o que isto tem a ver com a felicidade? Exato, não tem a ver até você descobri que nada importa, o universo vai emitir informações, vai se adaptar para seus elementos existirem e os objetos serão adaptados com ou sem o ser humano estarem no planeta Terra. O universo não importa com sistemas religiosos – não disse espirituais, que é diferente – sistemas morais, sistemas sociais, sistemas científicos etc. Porque o ser humano criou a cultura para entender a realidade e viver no mundo – num ser imanente dentro dessa realidade – mas, isso tornou ele muito escravo desse mesmo sistema. Não soube lhe dar com mudanças, com os outros seres do planeta, do ambiente e tal. A infelicidade é a frustração de não dominação dessa natureza. De não poder entender tudo e de não ter tudo. O “tu deves” dominar e escraviza e esquecemos o “quem sou”, aquilo que somos e queremos. Escondemos nossos impulsos por causa dos códigos morais, escondemos quem somos para agradar os outros. As máscaras nos sufocam.

Amauri Nolasco Sanches Júnior 





quarta-feira, 23 de março de 2022

Boulos é um político esquecido e a cadeirante heroína

 






Muitas perguntas rodeiam minhas dúvidas, mas uma em especial não foi respondida. Essa pergunta é: o porquê as pessoas não abrem mais links de notícia? Nem mesmo links de tragedia – que era muito acessado – as pessoas estão lendo e isso é muito problemático. Por quê? Porque as pessoas estão se acostumando em se informar só com memes, frases curtas, ou vídeos e não mais com leituras. Isso me faz ver que – num modo geral – foi uma luta constante nossos ancestrais terem lutado por uma igualdade educacional, para o ser humano de hoje, não dar o devido crédito em ler o que é escrito. Tantos conhecimentos as pessoas perdem por causa da preguiça? Kant - um dos últimos dos iluministas – já tinha falado disso.

Kant, em sua resposta o que seria o iluminismo, escreveu que as pessoas são cômodas e não querem sair da minoridade, porque não querem ser adultas e tomarem as decisões sozinhas. Ninguém quer assumir suas decisões e as consequências que essas decisões contêm dentro da sua vida. O governo não são o seus pais (pai e mãe), a igreja não vai te dar respostas definitivas como a ciência, contendo uma ótima ferramenta para a filosofia. Será que a filosofia não é uma coisa vista por não dar certezas? Essa é a questão, o mundo se transformou em desejos de certezas que não temos, nem da ciência (que funciona como hipóteses e teorias) e reflexões filosóficas que também, não dão certezas, mas coloca o ser humano em um mundo com fatos incertos. Mas, minha dúvida inicial, da não leitura, não está respondida.

Ler devota tempo. O que seria o tempo? Bergson escreveu que o tempo sempre é o presente, pois, o passado seria imagens da sua memória que não são mais reais. Trazendo para os dias de hoje – com o avanço da informática e internet – a memória são imagens de um momento congelado em significado, mesmo o porquê, significado contém sentimentos. A mente logica cartesiana, foi um erro porque a nossa mente, não processa só lembranças ou imagens significativas por razão e sim, por significado de coisas sentimentais para nós. Ou seja, vamos dizer que as lembranças são a virtualização daquilo que significou e em alguns casos, vai perdendo a forma, mas não o significado sentimental. Quando assistimos agora o seriado Chaves, temos uma lembrança afetiva, mas, não achamos tanta graça quanto achamos quando vimos lá trás. Do mesmo modo a polemica recente da foto do Silvio Santo sem maquiagem e sem dente, que nos assustou, mas mostrou o Silvio como ele está atualmente. Mas, por que nos assustou? Porque nos mostrou que até ele – um dos comunicadores mais vistos daqui – também envelhece.

Talvez, algumas imagens que temos dentro do protótipo de reconhecimento da realidade, na verdade, é uma imagem virtual que queríamos que essa realidade se torna uma certeza. Não gostamos de incertezas. Não gostamos que nos privem de imagens significativas com nossa memória afetiva, que, na maioria das vezes, nos dará certezas de um mundo alegre e confortável. Ai que esta, o confortável (conforto) tem a ver com o que nos dará prazer. Exato, nosso impulso sempre é por prazer e felicidade. A agressão é por causa da privação por prazer, quando o sujeito não tem mais a certeza, não tem a promessa de um mundo livre. A liberdade que tanto sonhava os franceses – com a igualdade e fraternidade – não passou de uma cilada burguesa, de libertar a burguesia do seu burgo e depois, num ato de traição, colocaram um novo governo também burguês. Desde então, todos os governos foram de quem detinha os meios de produção – mesmo os governos ditos socialistas – e não votamos em ninguém que represente e faça algo pela maioria. O século vinte foi um século niilista que não acreditou em nada, acreditou numa promessa vazia, acreditou no sonho de liberdade e felicidade.

Ora, mas o porquê a aversão dos meios de conhecimentos que temos agora? Será que se tem aversão em coisas que vão tirar essa imagem confortável das memorias afetivas? Talvez, a questão de ser feliz foi iludida por objetos e não gestos, não meios de sentir aquilo como uma coisa importante. Importância. O que seria importante num mundo, cada vez mais, niilista e hipócrita? Volto meu pensamento no nada. Afinal, por que existe uma realidade e não um nada total? Os gregos acreditavam que o caos – um grande abismo – existia e quando tudo se harmonizou se começou a realidade. Essas imagens religiosas – que não passa de estereótipos da realidade como objetiva ou subjetiva – são imagens explicativa da mesma realidade, como se tivéssemos uma memória ancestral. Será? Será que a minha imagem da espiritualidade é um mundo feito de consciências conectadas entre si mesmas? Mas, qual seria a sua finalidade? Vale lembrar, que o universo no seu início, segundo pesquisas serias, era caótico, ou seja, nada diferente da imagem grega do caos (nem a hindu e dos curdos, do grande ovo primordial).

A realidade, na essência, tem a ver com o objeto porque tem a ver com a questão do objetivo. Se vejo uma garrafa de água – como objeto que eu olho – meu objetivo e tomar a água dentro dela, pois, é o que mais quero. Daíse entra dentro do objeto como representação. O que representa a água para mim? O que representa para todo ser vivo, um elemento importante para continuar vivendo. Como um elemento de limpeza e indo mais longe – quase em transcendência – é o simbolismo da pureza espiritual e sentimental, por causa da sua transparência. Mas, a transparência também é um símbolo, uma imagem única e que só a água e seus derivados, podem nos proporcionar.

A imagem de algo é como medimos a realidade, uma realidade que não tem razão uma conexão com fatos eternos. O envelhecimento é uma das muitas questões de não conter fatos eternos, e assim, talvez Heráclito, esteja com a razão. Tudo muda. A realidade não é única e não pode ser considerada um fato só. Por que as pessoas não podem aceitar isso? Por que não podemos aceitar que todas as imagens que temos são imagens que podem mudar? diante das imagens das nossas crenças – crenças essas sustentadas por valores a muito aprendidos – montamos imagens solidas das muitas realidades subjetivas da realidade maior. Talvez, ninguém gosta de ler sobre coisas que vão deixar ansioso, por outro lado, é um desinteresse em saber e se posicionar como um cético de verdade. O problema não é ler, mas, mudar a muitas imagens.

 

Amauri Nolasco Sanches Júnior





 

sábado, 19 de março de 2022

Como disse Raul: ‘Ah, quantas ilusões’


 Amauri Nolasco Sanches Júnior

 

<<A ideia, imanente à maioria das filosofias e natural para o espírito humano, de possíveis que se realizariam por uma aquisição de existência, é, portanto, pura ilusão. Seria o mesmo que afirmar que o homem de carne e osso provém da materialização de sua imagem percebida no espelho, sob a alegação de que há nesse homem real tudo o que se encontra nessa imagem virtual acrescida da solidez que faz com que possamos tocá-la”>>

 

– Bergson, O Pensamento e o Movente

 

O ser humano como ser-do-mundo é um ser que pensa estar na realidade, mas, o real pode não ser real, só pode ser um ser virtual. Uma maçã, por exemplo, é uma imagem daquela percepção ótica da imagem o que seria uma maçã. Ali nasce o conceito de fruta. Claro, a consciência sabe que aquilo é o objeto maçã, porque temos uma ligação-aprendizado do termo que se chama a fruta e o que essa fruta representa dentro da nossa realidade. Será que a realidade são mesmo percepções dos objetos e seus objetivos? A realidade compõe também valores morais – que são inseridos dentro de uma sociedade – dentro do que a sociedade tem como sentimento coletivo. Ora, vários desses valores morais são valores colocados dentro dessa mesma sociedade, dentro de histórias mitológicas – sim, temos mitos modernos – que são derivadas desses valores. Além do mais, esses valores nem sempre são questionados por que as pessoas não refletem e acham, bastante, confortável acreditarem nesses valores. Na maioria das vezes, são ilusões mitológicas.

Um desses mitos é mito da liberdade. inicialmente, a questão da liberdade sempre foi atrelada na felicidade, pois, ser liberto na realidade é fazer o que se quer e tem vontade. Liberdade, felicidade, realidade e vontade. A vontade tem a ver com a liberdade, pois, se fazemos o que temos vontade, somos felizes. Mas, nem sempre o que queremos estar de acordo com a moral social e essa moral social, também, não está de acordo com a felicidade de cada um. Então, o que fazer? Será que podemos quebrar a moral vigente para predominar a felicidade? São dúvidas feitas por milênios e essas dúvidas são legitimas dentro da filosofia. Mesmo o porquê, Aristóteles dizia que somos animais sociais por sermos racionais e construímos éticas e morais para convivemos com o outro, porém, ao mesmo tempo, procuramos ser feliz. Para o filósofo grego, o mais importante é a amizade, pois ali, estará sempre a felicidade. A busca da felicidade sempre foi a busca de quem somos e o sentido de tudo.

Se Tales de Mileto dizia que a origem de tudo era a água (úmido), Sócrates achava que não adiantaria nada se conhecêssemos a realidade dos objetos e suas origens (e finalidades) e não conhecer a nós mesmos. Mas, o que seria conhecer a nós mesmos? O que significaria conhecer nossa própria natureza? Talvez, Sócrates tenha razão, porque podemos nos conhecer e ainda, conhecer o propósito de uma realidade. Afinal, a inscrição no templo de Delfos era conhecer a si mesmo e assim, conhecer o universo (a realidade) e os deuses (metafisica da origem). Por outro lado, a origem (arké) é um conceito de saber como originaram as coisas, ou, as ideias que fazemos das coisas. Uma arvore não era uma arvore antes do ser humano dar o nome do ser vivo vegetal com um tronco e ramos de galhos e folhas – além de frutos e flores – de arvore. Assim como cavalo não era cavalo no modo selvagem e sim, um ser vivo que corria nas pradarias. As baratas eram insetos que comiam coisas podres antes mesmo que o ser humano existisse ou tivesse nojo delas – por causa da evolução delas e por causa do parentesco delas com os cupins que consomem madeira podre – e então, nossa ideia da realidade tão pouco importa para um universo que pouco importa para nossas opiniões ou teorias.

A questão é sempre – pelo menos para a maioria da humanidade – uma questão imanente (existente) e não transcendente. As pessoas, por medo ou ignorância, nunca querem transcender um conceito porque acham que nunca vão ganhar nada com essa transcendência. Por exemplo, um fiel de uma igreja hoje (leia-se neopentecostal) não quer algo transcende do espírito, pois, a vitória – como eles mesmos dizem – não é a vitória espiritual da religação com o divino, mas a vitória de bens materiais. Isso chamamos de igrejas materialistas. Por quê? Entenderam a questão material do judaísmo muito mais que entenderam a questão espiritual, que uma boa educação e um bom relacionamento com a realidade, poderia ser benéfico tanto num modo material como num modo espiritual. Pois, entender a si mesmo e toda a realidade que nos cerca, sempre é entender o que precisamos para uma vida feliz e não muito material. Afinal, a questão da vitória, sempre tem a ver com a conquista de si mesmo diante dos fatos. Fatos definem a realidade e não coisas.

Quando olhamos uma fotografia, olhamos um momento da realidade, no qual, a fotografia foi tirada. Se tivemos sorte, conseguimos registrar o momento que expressamos algum sentimento. Mas, os fatos dessa fotografia nunca vão ser, totalmente, registrados. São apenas um momento. Um momento nunca vai ser um fato, uma ruptura com um conjunto de acontecimentos que aquilo engloba. Por isso mesmo, como disse Nietzsche, não há fatos eternos como não há verdades absoluta. Não há fatos que se eternizem porque o tempo é contínuo, as verdades de hoje, não serão as verdades do amanhã. A verdade não será, facilmente, alcançada se não transcendemos alguns conceitos linguísticos, conceitos religiosos e conceitos ideológico. 




quinta-feira, 17 de março de 2022

Danilo Gentili e a educação vagabunda brasileira








O bom menino não faz pipi na cama

O bom menino não faz malcriação

O bom menino vai sempre à escola

E na escola aprende sempre a lição

(Carequinha)

 

Cresci ouvindo essa música do palhaço Carequinha – que já era velha – e sempre gostava porque criança não pensa muito dos pormenores de uma letra. Claro, o pensamento e a indagação tomaram meu espírito e comecei a me perguntar: o que é ser um bom menino? Ser passivo com as autoridades, mesmo, que elas te levem para um outro lado? Fazer xixi na cama não seria uma disfunção ou um trauma que a criança sofre? Uma vez um motorista disse que não ia me entregar e ia deixar eu na kombi dentro da instituição onde fazia tratamento – em meados dos anos 80 – acabei chorando (tinha 7 ou 8 anos) e feito xixi dentro da perua. Ao chegar na minha casa, o motorista tinha dito que chorei e tinha mijado e precisava lavar, e minha mãe disse um sonoro: o problema é do senhor. Foi assim que fui criado, com educação e respeito, mas, tem um certo limite.

Esse “bom menino” sempre foi uma educação hipócrita que acha que as crianças devem ficar passivas em algumas situações – não só de assédio sexual, como assédio moral – dos mais velhos que querem impor medo ou impor outras coisas para intimidarem indefesos. Sempre quando dizem “no meu tempo não...” sempre me remete aquilo que eu aprendi como uma visão subjetiva de um mundo que não existe, e se existe, existiu só no lugar onde você viveu. Ou, baseado nas suas próprias crenças, essas lembranças ficam distorcidas para confirmar aquilo que se acredita. A realidade acaba sendo uma representação dos objetos que tem um objetivo, um conceito que se constrói com a leitura dessa realidade. A meu ver, a realidade tem uma parte real (realismo) e uma parte ideal (idealismo) que remete aquilo que, para nós, deveria ser a realidade, mas não é.

Portanto, não existe um “bom menino” num mundo realista – as pessoas são o que elas são com o conhecimento que tem – e sim, seria um ideal (idealismo) de uma moral que, ainda, não temos, e talvez, não teremos. Moral é um conjunto de regras que conduz a sociedade a uma convivência dentro de cada individualidade, mas, para medir essa moral (para não se tornar um moralismo) tem que ter a ética. no mundo moderno e contemporâneo, a ética virou uma ferramenta de medida da moral para não virar, ora moralismo, ora imoralidade. Ai está a questão: qual o critério de medida um do outro? Sempre terá uma medida moral. E sempre essa medida moral será subjetiva e será construída dentro de uma subjetividade – seria uma espécie de medida do objeto segundo sua própria ótica – e dentro da visão da realidade que você mesmo construiu. Segundo os valores que você aprendeu.

Na teoria, a escola deveria construir valores morais dentro de uma ótica social – sem nenhum viés de ensinar questões de profissão que deveria estar a cargo da universidade – mas, na prática, não é isso que acontece. Desde quando o Brasil foi colonizado, há uma grande dificuldade de se ter uma escolarização de verdade com qualidade, o que vimos, sempre a escolarização foi uma máquina de construir pessoas doutrinadas. Quando éramos colônia de um país ainda feudal e seguidor da escolástica, existia o mito do padre que pregava que os meninos só eram educados se virassem padres, afinal, eram os detectores do conhecimento. A nossa educação escolar sempre foi avessa a crítica porque ela sempre foi doutrinaria, mesmo hoje, é muito difícil você ensinar uma visão crítica sem receber a pecha de “comunista”. Porque o comunismo quer acabar com a sociedade e a família – não é isso que Marx escreveu – mas, o outro lado que se diz conservador (vide tradicionalista) são os que mais traem ou gostam de programas de tv duvidosos.

O professor Cristiano (Fábio Porchat) – do filme do Danilo Gentili – é uma sátira do professor esquerdo-macho que tem tendencias a pedofilia. Claro, não gosto do tipo de humor que o Gentili faz, me soa escroto e exagerado, mas, censurar um filme não me parece uma tática eficaz de denunciar que duas crianças fizeram a cena. Mesmo o porquê, fizeram propaganda do filme de graça para ele. E no mais, só reforça a minha análise de uma cultura doutrinada a não mostrar críticas da própria sociedade. Meus textos de crítica não são lidos. Por quê? A sociedade não gosta de críticas dela mesma, gostam de críticas dos políticos, dos artistas, dos apresentadores etc. Porque gosta de jogar a culpa sempre no outro, sempre as decisões são dos outros, sempre são os outros que não sabem fazer. Como disse Sartre, o inferno são sempre os outros, porque temos necessidade de proteger nossas próprias opiniões.

Como nos anos 80, uma Gretchen aparecer num programa como o Bozo era diferente se ela aparecesse um programa como do Gugu (Augusto Liberato), porque tem que ver todo o contexto que isso se processa. Uma criança não tem uma mente sexualizada como os adultos têm, e isso, tem a ver com o conceito da sexualidade que uma cultura é construída. Como já disse, um conceito é aquilo que damos nomes, damos conotações. É um julgamento de juízo sobre a exige da moral, por outro lado, pode ser um nome para separar de outras circunstâncias que o fato trás. Posso achar uma barata nojenta e uma borboleta linda e isso, são conceitos de nojento e de lindo. Ora, alguns podem dizer que a Gretchen não poderia estar no programa do Bozo (por ser um programa infantil), mas, outros já tinham uma visão mais aberta e diziam que as crianças não tinham maldade. Na verdade, o SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) sempre teve uma visão popular e a visão popular é essa – mesmo que religiosos fanáticos não concordem – porque é uma visão periférica da sociedade. Na essência, sempre foi. Pinturas em paredes ainda conservadas romanas – geralmente, de pompeia – mostram essa visão sexualizada social latina, onde “porne” era o adjetivo de “meretrizes”,

Será mesmo que sabemos o que é conceito e como fazemos para interpretar esses conceitos? Tenho minhas dúvidas.

Amauri Nolasco Sanches Júnior




 

#bergson #teoriadamemória #fenomenologia #cafedamanha #anotação #filosofiacontemporânea #wwf

segunda-feira, 14 de março de 2022

Cadeiras de rodas e deficiências e a guerra maldita

 





Na última vez que eu vi o filme do Conan, o bárbaro – com Arnold Schwarzenegger de 1981 – havia um enigma que pairava o ar das matanças do rei bruxo que conquistava e matava os povos (depois que Atlântida afundou no mar, em alusão dos impérios que caem). O enigma é uma pergunta: “o que é mais forte, a carne ou o aço?”. Para entender a pergunta, temos que entender a frase que começa o filme dita pelo filósofo Nietzsche: “Aquilo que não me mata só me fortalece”. Nietzsche diz isso de forma das tragedias gregas, se numa batalha, o que não me matar nos deixa muito mais forte. Num reencontro com o rei bruxo – agora ele é um sacerdote com uma seita qualquer naquele mundo – ele diz para Conan, que buscava a mesma resposta do enigma para ficar em paz com o deus Crow (alusão a Odin, pois, crow em inglês é corvo e o deus nórdico tinha dois corvos), que a carne é muito mais forte. A vontade sempre vence o aço, porque o aço é empunhado pela vontade de lutar.

Nietzsche herdou a vontade de Schopenhauer, porque o ser humano era movido pela vontade de lutar e abrir caminho para a luta e a capacidade de ir onde queira. O filósofo achava que isso era a vontade de viver e não se deixar abater por mazelas da vida, pois, a renegação da vida seria uma negação a aquilo que te faz forte. O impulso freudiano (que dizem, foi herdado do próprio Nietzsche), onde sempre lutamos para viver e não nos abater diante das dificuldades. Mesmo o porquê, se ficarmos olhando para o abismo, o abismo olha para você mesmo. Mesmo com uma deficiência, devemos lutar até o fim pela nossa vida e o direito de temos essa vida. Afinal, como disse o rei bruxo no filme do Conan, a carne é muito mais poderosa do o simples aço, a vontade nos faz nos mover.

Enquanto as pessoas ficam procurando lado em tudo – graças a uma polarização burra – as coisas sempre tendem a dar errado aquelas pessoas que estão bem abaixo do poder. governos fazem guerras, mas quem mais sofrem são as pessoas mais vulneráveis. Imaginem pessoas com deficiência nas guerras que se teve? Hoje, estamos assistindo uma guerra mostrada em tempo real graças a tecnologia, por outro lado, nos faz refletir em outras guerras que se teve muitas atrocidades que não foram mostradas. E as pessoas com deficiência em instituições na primeira grande guerra mundial? Será que prédios caíram com pessoas lá? quantas pessoas com alguma deficiência não morreram ou sofreram violência em guerras? Não esta sendo diferente com a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, onde o exercito russo tenta tomar o país e controlar seu território, graças a uma conversa – que nunca teve – que a Ucrânia iria entrar na OTAN.

Uma cadeirante chamada Tanya Miroshnikova, com 31 anos, conseguiu fugir da cidade onde vivia ainda no mês de fevereiro, mas outras pessoas com deficiência não tiveram a mesma sorte. Tanya – que já presidia uma ONG em defesa aos direitos das pessoas com deficiência na Ucrânia – tem um projeto de resgate de pessoas com deficiência deixadas sozinhas graças com voluntários e deseja arrecadar fundos para isso acontecer. O ponto é: será que governos ainda viram que existem esse tipo de pessoas nesses países? Estamos vendo o que aconteceria, caso existisse uma possibilidade, de se ter uma guerra mundial. Pois, as pessoas menos vulneráveis, são deixadas sozinhas porque o instinto de sobrevivência é muito maior do que o instinto de empatia. Ora, mas, longe de instintos, deveríamos ser movidos por racionalidade de ver o outro como um semelhante e não um objeto. A crise humanitária também traz uma outra constatação: a esquerda hereditária (politicamente correta) também se mostrou desumana ao dizer que há um erro e o erro é só ucraniano.

A meu ver o erro é humano – e é inacreditável que em pleno seculo XXI tenham guerras – em achar que o erro é do outro. Como disse Sartre em algum lugar, o inferno sempre será os outros, porém, muitas vezes, o inferno sempre é nosso e as nossas escolhas são nossas. Por isso mesmo, somos condenados a ser livres, a sermos seres que temos consciência da nossa realidade e sim, a carne é muito mais poderosa do que o aço.

Amauri Nolasco Sanches Júnior 



segunda-feira, 7 de março de 2022

A-ha e o sol brilhando também nas redes sociais

 


eu tinha uma dessa




Eu gostava da banda A-há. Quem que viveu no finalzinho dos anos 80 e não escutou uma música deles? Dias desses, eu estava ouvindo um cover de uma música deles, The Sun Always Shines TV (O Sol sempre brilha na TV), onde há uma crítica muito feroz da televisão. Até o final dos anos 90 – pelo menos no Brasil – a televisões abertas tiveram sua hegemonia e tudo era maravilhoso, elas manipulavam com as informações. Essa música fala dos programas que mostravam um mundo belo – no clipe mostra uma sala cheia de manequins – onde não tinham pessoas feias, pessoas que não tinham caráter e mais do que isso, escondiam o que mais podre tinha na política. Piorou quando os yanques – porque todos nós somos americanos – quiseram abrir o mercado globalmente e isso só era viável, via internet. Pegaram uma invenção para a guerra fria – caso acontecesse uma guerra nuclear – e, já que a URSS desfarelou, abriu para computadores caseiros de lá. Desde então, o mundo globalizado aconteceu e uma outra coisa aconteceu, a anarquização dos meios de informação democratizando ao máximo esse meio.

A anarquização – e a própria anarquia – não é uma bagunça total na sociedade. Isso foi disseminado para o povo não gostar da ideia e se libertar da corrente que nos prende entre nós e o poder. A anarquização aconteceu graças a democratização clara – uso democratização por causa da etimologia do termo grego que é o poder do povo – dos meios de informação e o porquê e o meio de informação antigo, até ter perdido esse poder, querem destruir esse novo meio. Mas, esse meio de informação é muito maior que se imaginou, não será destruído e ele aos poucos tomara o lugar do antigo. Por outro lado, a internet e o YouTube – como um dos principais canais de vídeos – herdaram os mesmos problemas da televisão e a mídia, num modo geral. Estamos vendo uma guerra insana, de uma superpotência militar como a Rússia, atacar a Ucrânia, que tecnicamente, são o mesmo povo. Por quê? Porque Vladimír Putin é um efeito colateral da guerra fria e o socialismo stalinista e um reacionário – como Bolsonaro e o russo Alexandre Dugin, onde aconselha Putin – onde espera uma Rússia nos velhos tempos.

 Só que não voltara nada, a evolução tecnológica e os meios de informação, fizeram que o ser humano tivesse outras ideias. A questão não é mais ideológica – apesar que o pessoal ainda insiste com essa bobagem – e sim, uma questão de revolucionários e reacionários. Os revolucionários gostam de idealizar um futuro justo (o que seria justo numa revolução armada?), mas, esquecem que o justo e o injusto dependem muito da visão subjetiva daquilo que se faz justo. O conceito do justo não é a igualdade, pois, a igualdade pressupõe a dissolução daquilo que é justo e daquilo que pertence a cada um conforme o trabalho feito. O conceito do justo é alcançar o a justiça dentro da capacidade de alcançar aquilo, sem ao menos, ser injusto com o outro que alcançou esse objeto dentro daquilo que foi buscar. A idealização de um futuro pressupõe, também, um controle dos acontecimentos que, nenhum ser humano, contém. O reacionário, por sua vez, vai buscar no passado elementos que estão no seu imaginário, ou seja, nunca existiu esse passado. Não éramos felizes. Tínhamos uma inflação de mil por cento. Tínhamos medo de uma guerra nuclear. Tínhamos filmes com efeitos toscos, desenhos que não tinham começo e nem final. Tínhamos muito pouca informação. O niilismo do século 20 – quando digo niilismo, me refiro ao niilismo que Nietzsche condenava – se mostrou ineficaz dentro da vida comum, não nos trouxe respostas nenhuma.

A pergunta existencialista “por que a existência e não o nada?” não nos levou para reflexões mais profundas da existência, porque essas reflexões ficaram confinadas dentro das profundezas da academia. Ou, foram suprimidas por hipóteses cientificas que mostraram fenômenos químicos biológicos – que só responderam o resultado e não a causa dessa existência – e que, grosso modo, responderam só uma parte do problema. Claro, fenômenos da nossa realidade são fenômenos químicos em que moléculas constroem corpos físicos – sejam biológicos ou não – onde a realidade se faz existir enquanto um conjunto de objetos. Mas, a dúvida existencialista tem um ponto chave: porque a existência e não o nada. Aí chegamos num ponto, o nada é a negação do ser. o ser é uma totalidade, um objeto com o objetivo. A meu ver, o nada nos separa do ser e a essência da existência, porque o nada é o abismo que nos faz olhar para ele. O nada é o conceito simplificado que vira um conceito massificado para virar inteligente, mas, não passa de um conceito para designar aquilo que não se entende ainda. O nada – como diz a serie Star Trek – é a fronteira final.

Herdamos o conceito estético da televisão, porque essa geração nasceu multimidia, mas tem as mesmas exigências estéticas do tempo da televisão. Os mesmos sonhos. Os mesmos conceitos. Portanto, não adianta anarquizar as informações se no fim, o mesmo acontece. O sol continua brilhando. 


Amauri Nolasco Sanches Júnior




quinta-feira, 3 de março de 2022

O menino alemão da Netflix

 





Faz tempo que não escrevo sobre deficiência e não é para menos, ando desencantado com o segmento e não tenho vontade de escrever sobre o assunto. Mas, dia desses, vi uma amiga mostrar um filme na Netflix – Perdoai-nos as nossas ofensas – sobre nazismo e deficiência. Em apenas 15 minutos você assiste um filme bom e que mostra muito mais do que um de 2 horas – como A Sombra de Stálin que só é mais um romance histórico. A história se passa na Alemanha nazista e aparece um menino sem um dos braços se revoltando contra os nazistas – pelo que entendi, a mãe era a professora – e o clima do curta esquenta, quando ele pergunta se a mãe acredita naquilo tudo e ela diz que é o que mandam ensinar. A SS – a polícia nazista – bate na porta e quer levar o menino, que claro, a mãe protege e manda correr e eles matam a mulher. Em um dado momento, o menino corre, mas é alcançado por um dos homens da SS e ele tenta enforcar o menino por estrangulamento, porém, o menino alcança a arma do homem e o mata e rouba seu sobretudo.

O retrato é muito claro quando você vê a luta entre o menino – sem um dos braços – e o agente da polícia nazista, onde não tinham escrúpulos para seguirem ordens. Relatos informam que agentes da SS jogavam pessoas cadeirantes pela janela dos apartamentos, pegavam crianças com síndrome de down ou outra deficiência cognitiva ou física e, dizendo que iriam tomar banho, elas morriam sufocadas com gás letal e pior, eram cobaias do que ficou conhecido como câmara de gás. O conceito (ou preconceito) nazista era que a deficiência era um fardo a ser radicalizado, pois – antigamente se achava que as deficiências eram hereditárias – não éramos viáveis dentro de uma sociedade e isso foi alimentado com a ideia de que os gregos matavam seus deficientes. A questão é – isso eu vi no canal do Slow – que pesquisas recentes dizem, que não é bem assim que se processava. Existem evidencias até mesmo, um rei espartano com deficiência.

O fato é que, a deficiência sempre foi vista como uma imperfeição porque havia uma ideia, que a deficiência era uma desarmonia do corpo. As doenças são classificadas assim e sem motivo, éramos classificados como pessoas deformadas que não somos felizes, pois, felizes são as pessoas autônomas que não tem nenhum problema de andar. Mas o que é conceito?  Um conceito é a imagem que temos da visão subjetiva de algo, enquanto ter uma ideia, é a visão geral desse algo. Por isso que quando uma pessoa constrói um pré-conceito – que é diferente de discriminação – para montar um conceito que, muitas vezes, está errado. O “coitadismo” da deficiência, é uma visão de séculos que durou ate se descobrir tecnologias que poderiam nos dar conforto e uma vida, mais ou menos, confortável. Cadeiras de rodas. Órteses e próteses. E muitos outros avanços que serão importantes para nossa vida.

De algum modo – isso é bem recorrente não só aqui – esse “coitadismo” perdura e é um atraso em uma outra ideia, é a visão que as pessoas com deficiência não são “coitadas”. O “capacitismo” (o incapaz), pressupõem que nós não temos nenhuma capacidade de fazer as coisas e essas coisas são o que todo mundo faz. Ninguém pode dizer que os nazistas estavam errados, se os ingleses apoiam aborto de crianças com síndrome de down, se muitos países do talibã crianças deficientes são mortas por “piedade”, entre outras coisas que pessoas com deficiência ainda passa na vida. A realidade – enquanto mundo onde se vive – tem suas outras visões, pois, a incapacidade de um ser humano (mesmo com deficiência) não pode ser medido daquilo que se acha que é perfeito ou imperfeito. Mesmo o porquê, o perfeito e imperfeito são medidas artificiais de uma visão muito mais cultural do natural da realidade, onde o perfeito é idealizado como uma forma última e sublime. Mas, existe o perfeito?

A meu ver, o curta nos ensina que mesmo sem o braço, o menino alemão mostrou muito mais bravura.

Amauri Nolasco Sanches Júnior