Cresci ouvindo essa música do palhaço Carequinha – que já era
velha – e sempre gostava porque criança não pensa muito dos pormenores de uma
letra. Claro, o pensamento e a indagação tomaram meu espírito e comecei a me
perguntar: o que é ser um bom menino? Ser passivo com as autoridades, mesmo,
que elas te levem para um outro lado? Fazer xixi na cama não seria uma disfunção
ou um trauma que a criança sofre? Uma vez um motorista disse que não ia me
entregar e ia deixar eu na kombi dentro da instituição onde fazia tratamento –
em meados dos anos 80 – acabei chorando (tinha 7 ou 8 anos) e feito xixi dentro
da perua. Ao chegar na minha casa, o motorista tinha dito que chorei e tinha
mijado e precisava lavar, e minha mãe disse um sonoro: o problema é do senhor. Foi
assim que fui criado, com educação e respeito, mas, tem um certo limite.
Esse “bom menino” sempre foi uma educação hipócrita que acha
que as crianças devem ficar passivas em algumas situações – não só de assédio
sexual, como assédio moral – dos mais velhos que querem impor medo ou impor
outras coisas para intimidarem indefesos. Sempre quando dizem “no meu tempo não...”
sempre me remete aquilo que eu aprendi como uma visão subjetiva de um mundo que
não existe, e se existe, existiu só no lugar onde você viveu. Ou, baseado nas
suas próprias crenças, essas lembranças ficam distorcidas para confirmar aquilo
que se acredita. A realidade acaba sendo uma representação dos objetos que tem
um objetivo, um conceito que se constrói com a leitura dessa realidade. A meu
ver, a realidade tem uma parte real (realismo) e uma parte ideal (idealismo)
que remete aquilo que, para nós, deveria ser a realidade, mas não é.
Portanto, não existe um “bom menino” num mundo realista – as
pessoas são o que elas são com o conhecimento que tem – e sim, seria um ideal
(idealismo) de uma moral que, ainda, não temos, e talvez, não teremos. Moral é
um conjunto de regras que conduz a sociedade a uma convivência dentro de cada
individualidade, mas, para medir essa moral (para não se tornar um moralismo)
tem que ter a ética. no mundo moderno e contemporâneo, a ética virou uma
ferramenta de medida da moral para não virar, ora moralismo, ora imoralidade. Ai
está a questão: qual o critério de medida um do outro? Sempre terá uma medida
moral. E sempre essa medida moral será subjetiva e será construída dentro de
uma subjetividade – seria uma espécie de medida do objeto segundo sua própria ótica
– e dentro da visão da realidade que você mesmo construiu. Segundo os valores
que você aprendeu.
Na teoria, a escola deveria construir valores morais dentro
de uma ótica social – sem nenhum viés de ensinar questões de profissão que
deveria estar a cargo da universidade – mas, na prática, não é isso que
acontece. Desde quando o Brasil foi colonizado, há uma grande dificuldade de se
ter uma escolarização de verdade com qualidade, o que vimos, sempre a escolarização
foi uma máquina de construir pessoas doutrinadas. Quando éramos colônia de um país
ainda feudal e seguidor da escolástica, existia o mito do padre que pregava que
os meninos só eram educados se virassem padres, afinal, eram os detectores do
conhecimento. A nossa educação escolar sempre foi avessa a crítica porque ela sempre
foi doutrinaria, mesmo hoje, é muito difícil você ensinar uma visão crítica sem
receber a pecha de “comunista”. Porque o comunismo quer acabar com a sociedade
e a família – não é isso que Marx escreveu – mas, o outro lado que se diz
conservador (vide tradicionalista) são os que mais traem ou gostam de programas
de tv duvidosos.
O professor Cristiano (Fábio Porchat) – do filme do Danilo Gentili
– é uma sátira do professor esquerdo-macho que tem tendencias a pedofilia. Claro,
não gosto do tipo de humor que o Gentili faz, me soa escroto e exagerado, mas,
censurar um filme não me parece uma tática eficaz de denunciar que duas crianças
fizeram a cena. Mesmo o porquê, fizeram propaganda do filme de graça para ele. E
no mais, só reforça a minha análise de uma cultura doutrinada a não mostrar críticas
da própria sociedade. Meus textos de crítica não são lidos. Por quê? A sociedade
não gosta de críticas dela mesma, gostam de críticas dos políticos, dos
artistas, dos apresentadores etc. Porque gosta de jogar a culpa sempre no
outro, sempre as decisões são dos outros, sempre são os outros que não sabem
fazer. Como disse Sartre, o inferno são sempre os outros, porque temos necessidade
de proteger nossas próprias opiniões.
Como nos anos 80, uma Gretchen aparecer num programa como o Bozo
era diferente se ela aparecesse um programa como do Gugu (Augusto Liberato),
porque tem que ver todo o contexto que isso se processa. Uma criança não tem
uma mente sexualizada como os adultos têm, e isso, tem a ver com o conceito da
sexualidade que uma cultura é construída. Como já disse, um conceito é aquilo
que damos nomes, damos conotações. É um julgamento de juízo sobre a exige da
moral, por outro lado, pode ser um nome para separar de outras circunstâncias que
o fato trás. Posso achar uma barata nojenta e uma borboleta linda e isso, são conceitos
de nojento e de lindo. Ora, alguns podem dizer que a Gretchen não poderia estar
no programa do Bozo (por ser um programa infantil), mas, outros já tinham uma visão
mais aberta e diziam que as crianças não tinham maldade. Na verdade, o SBT
(Sistema Brasileiro de Televisão) sempre teve uma visão popular e a visão popular
é essa – mesmo que religiosos fanáticos não concordem – porque é uma visão periférica
da sociedade. Na essência, sempre foi. Pinturas em paredes ainda conservadas
romanas – geralmente, de pompeia – mostram essa visão sexualizada social latina,
onde “porne” era o adjetivo de “meretrizes”,
Será mesmo que sabemos o que é conceito e como fazemos para
interpretar esses conceitos? Tenho minhas dúvidas.
Amauri Nolasco Sanches Júnior
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