sábado, 24 de setembro de 2022

Monark, o novo Sócrates

  



Por Amauri Nolasco Sanches Júnior

 

“Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância”.

(Sócrates)

 

O melhor filósofo que eu li, contemporâneo, que escreveu sobre Sócrates até agora foi Denis Huisman. Huisman faz um exercício mental – porque não sabemos nada de Sócrates e ele nada escreveu – onde coloca o filósofo grego como, realmente, um debatedor. Posso estar errado, mas, lendo as obras de Platão – fazendo o mesmo exercício mental de Huisman – e consigo ver alguma veracidade que estão em comum com outros autores que comentam o que Sócrates fazia. A forma irônica e como usa sua humildade como uma armadilha para amarrar seu adversário do diálogo. Muitos dizem que Sócrates é um personagem de Platão, mas, a meu ver, comediantes como Aristófanes (até hoje) não fazem anedotas com personagens. Você não escuta piadas sobre Bentinho, sobre a Narizinho e sim, de pessoas personificadas numa fama. Como dizem, Sócrates era uma figura bastante conhecida e que mexia com pessoas bastante importantes.

A questão pode ser colocada na seguinte forma: por que Sócrates escolheu essa vida de filósofo e não foi levado por outra coisa? Muitos especialistas – seguindo a tradição de Heródoto (historiador antigo) – dizem que, Sócrates foi levado a ir para o lado da filosofia por causa da pitonisa que disse que o mais sábio de Atenas era ele (na verdade, ela só respondeu o que o amigo de Sócrates tinha confirmado). Mas, confirmou ao mesmo depois e assim, ao longo da sua trajetória filosófica, ele dizia que filosofava por causa do “deus” e essa era sua missão. Missão essa de mostrar o quanto ela (a pitonisa) estava errada ao seu respeito. Sócrates foi soldado e como soldado salvou vários colegas e, talvez, tenha levado o treinamento militar para a filosofia de não fugir de um combate. Huisman diz no livro – chamado Sócrates – que a humildade dele, na verdade, seria uma questão de desarmar o adversário (se fomos, realmente, dizer que era ele mesmo nos diálogos).

O método (methodós=caminho) que Sócrates usava – segundo a tradição – é a maiêutica. A maiêutica, grosso modo, era o que ele dizia que é uma técnica (tekne) de parto de ideias (como era sua mãe parteira) onde há perguntas a serem feitas e respostas a serem dadas. A partir dessas respostas, Sócrates poderia “escalar” perguntas muito mais elaboradas até chegar na cerne da questão, mostrando, por assim dizer, uma noção que o interlocutor não sabia aquilo que ele dizia que sabia. Isso se dará entre a mera opinião (doxa) e o conhecimento (episteme). E então – segundo a apologia a Sócrates de Platão – Sócrates teria dito, primeiro, que uma vida não examinada não vale ser vivida. Segundo que ele saberia que a questão que ele trazia era que sabia da sua ignorância. Dai, pontualmente, diríamos que o conhecer a si mesmo era, na verdade, um convite para saber o seu limite (de tudo) e uma vida não examinada, não vale ser vivida.

Em dois milênios e mais alguns séculos, Sócrates passou para a posterioridade como um convite a filosofar e as inúmeras escolas que vieram depois dele, começaram a filosofia como se começou dali por diante. Huisman traz algo além (que chamamos de transcender), porque Sócrates acadêmico é muito sistemático e que, ainda, vive na sombra do seu discípulo, apaixonado, Platão. Sem dúvida, Platão amou Sócrates ao ponto de fazer todos seus diálogos, algo como um memorial. Mas, qual o intuito disso tudo? Por que Sócrates se deixou morrer por causa de uma condenação capital? Talvez, indo mais além, a imagem do filósofo que se suicida para um bem maior, seja aquilo que se chamou depois de ideal. O ideal socrático era a liberdade e não só do que eu gosto de fazer etc., mas, aquilo que as pessoas querem falar ou expressar e assim ser refutada por aquilo que ela é de verdade.

Sócrates, em nenhum momento, não disse que o outro não poderia dizer o que pensa, e sim, que as pessoas deveriam buscar o conhecimento para refletir por conta própria. Enquanto o oponente estava falando de amantes, Sócrates perguntava o que era o amor. Enquanto o oponente dizia dos atos heroicos de um herói, Sócrates perguntava o que era a virtude. Eram perguntas assertivas que desmontava a imagem que aquela pessoa tinha do que achava que sabia, e o que seria na realidade. Na verdade, Sócrates coloca que há sim, uma questão de saber enquanto conhecimento verdadeiro (episteme) e o que são meras opiniões (doxa) daquilo a partir só senso comum e aquilo que não existe. A Terra ser plana, já houve uma refutação e não existe nem discussão, mas, existem pessoas que acreditam. Sócrates perguntaria o que era forma, no sentido, para que isso.

Hoje a pergunta seria: qual o limite da liberdade? Teríamos de ter um limite da liberdade de expressão? A um ano, quando eu escrevia no Blasting News, escrevi uma reportagem sobre o Monark (Bruno Aiub) onde digo que naquele momento, o rapaz estava ganhando destaque graças ao seu questionamento. Na época – foi novembro de 2021 – Monark ainda era socio e apresentador do Flow e com o Igor. Em fevereiro desse ano – de uma forma estupida – defendeu a legalização de partidos nazistas, que no Brasil, é ilegal. É bom lembrar que o nazismo matou judeus, pessoas como eu (com deficiência) e outras tantas consideradas, esteticamente, fracas, e que eles chamavam de inferiores (eugenia). Claro, ainda hoje acontece, como a legalização de aborto em caso de crianças com Síndrome de Down no Reino Unido e em alguns ESTADOS norte-americanos – porque americanos somos todos – a família operar mulheres com deficiência o útero sem satisfação nenhuma. Se isso não é eugenia, o que seria então?

Hoje, Monark tem seu programa em uma outra plataforma (o YouTube o expulsou) e existem vários debates. Para continuar, existem vários parênteses que devemos abrir e analisar. Primeiro, não temos – mesmo – uma cultura de entrevista de confronto, humor “negro” (obscuro), e de conversas com várias pessoas e pessoas que você discorda. Quem dava as cartas, vamos dizer assim, era a mídia tradicional, que poderia colocar um presidente e tirar o mesmo presidente. Eram oligarcas da mídia. Tiveram que se adaptar – quase na marra – mas, não gostam da internet. Aliás, vários estudos dizem, que a internet deu vozes e os políticos não gostaram disso. Há uma responsabilidade no que você diz, porem, a meu ver, não podemos nos responsabilizar naquilo que elas entendem. Sócrates foi condenado por fazer a maioria pensar, não acreditar, de pronto, e tudo que as pessoas diziam. Será que esse era a acusação que pesava sobre ele? Será que Anito, Meleto e Licon, foram levados a isso ou o próprio ESTADO os levou como testa de ferro?

Quando estava vendo o debate entre Monark, Arthur Petry, Ricardo Ventura e Alexandre (o Negão), vi ali um debate socrático (como o Petry é comediante, ele foi com o boné do Bolsonaro e a camisa do Lula). E pensei: “será que a ideia do Monark é a mesma de Sócrates?”. Pois, a cerne de todo o problema é a liberdade, porque a questão é poder ser ate mesmo um idiota e se ele estiver cometendo um crime, ser processado nos transmites legais. O Brasil não vai virar uma Venezuela assim como, não existe força argumentativa para fortalecer um nazismo/fascismo aqui. A questão sempre foi a birra da grande mídia (e a elite que sempre mandou) com as mídias sociais, como meio de informação desde 2013. Eles não conseguem mais sustentar uma narrativa e quando sustenta, não dura muito por causa de informações vindas da internet. Isso irrita eles.

A meu ver, o pensamento libertário é um pensamento natural. Quem gosta de ficar preso? Quem gosta de falar o que as pessoas querem ouvir? Eu não me importo, por exemplo, de ser chamado de aleijado, porque eu sei que não sou. Mudar o termo deficiente para pessoa com deficiência não fez as empresas contratarem, não fez as escolas pararem de discriminarem e não fez mudar a visão de “coitadismo” que nossa sociedade nos trata. É ser bastante ingênuo que na questão da linguagem, algum preconceito sumiria. Por mais que tentem colocar o pensamento racional e sem o politicamente correto no lado fascista – aliás, obrigar a ter uma linguagem própria também faz parte da estética nazifascista – a questão semântica não pode ser uma solução, porque obrigar as pessoas a terem um comportamento também é uma ditadura.

Sócrates seria cancelado? 

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