segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Escritor empreendedor - Somos uma nação tecnocrata?

 




Em seus Pensamentos, o filósofo Blaise Pascal disse a seguinte frase: “zombar da filosofia é, na verdade, filosofar”. Ou seja, zombar da realidade é ter senso crítico, o bastante, para entender que aquilo não é verdade. Afinal, nós filósofos sempre buscamos essa verdade, pois, não sabemos o que é a verdade de fato. Aliás, fatos e verdades são objetos de estudos filosóficos a uns dois milênios e não se concluiu esse estudo, ou seja, a verdade e o fato não pode ser unicamente uma métrica para dizer se aquilo é ou não uma realidade. E, como somos uma nação tecnocrata – o poder da técnica, ou melhor, que é comandada pela prática – somos levados a textos peculiares que servem como dicas de algo que só existe uma prática. Não e gosta daquilo que é intelectual.

No blog “A Estranhamente” que é da escritora Maria Vitoria – onde cai por pesquisar como ganhar dinheiro escrevendo, porque aqui nem notícia abem o link – me dei conta do texto “4 formas de ganhar dinheiro como escritora” onde ela dará dicas de temas. Ela diz:

“Para ganhar dinheiro escrevendo você precisa antes de mais nada mudar sua mentalidade de escritora “amadora”, “iniciante”, “independente”, “não escritora” para… Escritora empreendedora.”

 

Na minha cabeça – e talvez, na cabeça dos escritores de um modo geral – um escritor já é um empreendedor em potência. Essa coisa de filósofo e escritor que não pode ganhar dinheiro com isso veio de Sócrates e Platão – como crítica aos sofistas – mas Sócrates recebia ajuda dos seus seguidores, que eram os filhos da aristocracia grega da época, e Platão era da antiga família real de Atenas. Claro, seria muito fácil criticar pessoas que ganham para isso, tendo recursos para não cobrar. Não invalidando suas obras – Platão foi um grande filósofo – mas isso já não deveria ser uma regra em ser um “escritor empreendedor”. No modo geral, escritores querem ser lidos e isso passa por um momento estranho da nossa história. Pois, como temos uma cultura tecnocrata, ao mesmo tempo, se despreza o sucesso. Por que um Paulo Coelho poderia ser um escritor ruim? Ou são críticas que não passa por uma análise apurada e só é repetida exaustivamente?

Num outro texto, “Como ganhar dinheiro escrevendo?”, que Maria Vitoria escreve os “4 nichos que você deve se atentar para ganhar dinheiro”, diz assim:

1. Área da saúde

2. Área da tecnologia

3. Área do empreendedorismo

4. Área da educação

 

Não desprezando o trabalho de ninguém, mas, se você escrever esses temas, você corre o risco de não ser lido. Na área da saúde, por mais que você tenha uma boa intenção, se você não conhecer o que esteja escrevendo vai acabar fazendo notícias falsas. Daí entra o “ctrl + c”, pois a maioria fica replicando textos alheios e se você copia, você passa a ser uma replicadora e um plagiador e isso, normalmente, é crime. Na área de tecnologia, o mesmo acontece. Empreendedorismo tem muito na internet – arrisco em dizer que esta, até mesmo, saturado. A área da educação é uma área que ainda – por acharem isso eu não sei nem o porquê – confunde educação com escolaridade, pois, educação os pais devem dar e a escola, devem dar a escolarização.

Ai a escolarização além de ser de especialistas, também tem a ver com filósofos. Também nascem questões como: por que não filosofia? Por que não falar de política? Pois, fica parecendo que escritores iniciantes só vão ganhar dinheiro com coisas práticas, reforçando ainda mais, nossa cultura tecnocrata positivista. Será mesmo que portais querem mesmo contratar pessoas que escrevem esse tipo de texto? Ainda, ela destaca – no mesmo texto – que existe subnichos que se pode usar:

Alimentação saudável

Programação

Desenvolvimento pessoal

Administração empresarial

Relacionamento e técnicas de sedução

Revisão e estruturação de artigos acadêmicos

 

Mais uma vez, são nichos de especialização que existem públicos específicos. Quem se interessa em programação? Programadores. Alimentação saudável tem também nichos específicos que podem ser explorados, mas são temas para quem gosta mesmo. No mais, parece aquele tipo de livro que você compra numa banca de jornal como “4 dicas para um relacionamento saudável”, “meta um foda-se na sua vida” e por ai vai. Não tenho nada contra – li muito livros desse tipo e gostei – o problema é você achar que a vida só vai valer a pena se você ler esse tipo de livro.

O problema disso tudo é os temas dessas dicas, nos remetem no marxismo indireto, o positivismo de Comte onde a ciência iria salvar a humanidade da barbárie. As duas grandes guerras do século 20 nos mostrou que a ciência, como outros estudos, não é salvadora de nada e é apenas uma técnica para se estudar a natureza das coisas, das doenças e das mazelas que todo dia descobrimos no universo.  Só isso. Junto com a filosofia – alguns cientistas negam isso – fazem a razão um instrumento saudável e eficaz para dar uma melhor vida ao ser humano.

Primeiro, para ser um escritor você tem que ter dom. Não se aprende a ser escritor – mesmo que insistam em cursos sobre – escritores são pessoas que sabem passar o que sentem ou o que pensam num papel. De Platão até Mia Souto, são escritores que sabiam o que estão escrevendo e são lidos ate hoje nos livros. A questão é: por que eu tenho, necessariamente, agradar nichos e escrever de um modo geral?

Segundo, não se tem uma cultura de leitores (por isso o sucesso do Twitter), o que temos – por se ter uma escolarização vagabunda – é um povo acostumado em leituras fáceis. Não se aprende programação em uma tuitada, não se aprende relacionamentos em um texto, se aprende com aprendizados de erros e acertos. Livros são necessários na programação. Práticas são necessárias para relacionamentos. E outra coisa, aprender programação não vai nos tirar de uma Matrix ou ganhar muito dinheiro, só se vai aprender uma técnica de construir sites e programas. Nada em especial.

 

Amauri Nolasco Sanches Júnior 

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