sexta-feira, 1 de abril de 2022

A bunda da Anitta e o pianista desconhecido





 Vendo um vídeo do Nando Moura – sim, vejo alguns vídeos dele – ele disse algumas verdades do gosto musical do brasileiro e do mundo. Claro, algumas posições dele sou contra – achar que só a estética antiga é um modo de arte, é uma delas – o que sou a favor, é a questão que se diz respeito ao gosto musical. Venho notando muito – desde o final dos anos 80 – que o gosto musical brasileiro vem sendo de músicas fáceis e ninguém quer discutir a letras das músicas. Lembro nos anos 90, que eu e meus amigos ficavam discutindo as letras da Legião Urbana sempre (e de outras bandas). Mas, a grande maioria não questiona, a grande maioria não fica perguntando: por que estou ouvindo essa merda?

Nando Moura comentou do pianista Nelson Freire – que faleceu recentemente – que desde os anos 40, toca músicas clássicas e mostrou que brasileiro não é feito de bundas e carnaval. As bandas Angra, Sepultura, Sarcófago, Ratos de Porão, e outras, também mostraram e mostram que o brasileiro nada tem a ver, só, com bundas e carnaval. Eu vou além – mesmo o porquê, não sou conservador a esse ponto – porque, desde o surgimento da lambada, o brasileiro vem emplacando sucessos fáceis e temporários que as pessoas não precisam analisar. A questão é: o porquê? Por que que as pessoas pararam de gostar de coisas belas e que tocam o coração e passaram a gostar de coisas de traição, de cafajestagem ou de putaria, sem ao menos, questionar se isso traz alguma coisa para a sua vida? Porque as pessoas vendem a ideia de que a prática é muito melhor do que a teoria, mas a tragedia é que nem sempre a prática tem que ser praticada sem ao menos, tiver um planejamento. Muito lindo esse discurso, porém, as melhores letras de música, são as letras trabalhadas e harmonizadas com a melodia.

Não que só ouça rock – muitas vezes, eu ouça também de Gloria Groove a Lana Del Rey – mas, se tem que ter bom senso de questionar alguns gostos que, muitas vezes, são introjetados dentro da cultura por questões financeiras de gravadoras, empresário e essa coisa toda. Daí inventaram que gostos são subjetivos, relativizando certas coisas. Mas, se gostos são subjetivos, então, o porquê tantas pessoas passam a gostar daquele tipo de música ou daquele tipo de coisa? gostos são subjetivos, dizem. Eu desconfio de pessoas que tem o mesmo gosto, gostam das mesmas músicas e dançam em micaretas porque gostam daquilo, me dá um ar de falsidade do mesmo modo de quem vai para a balada. Isso me lembra o seriado Família Dinossauro – eu passei a minha adolescência assistindo – onde existia a dança do acasalamento e ninguém questionava o porquê existia aquilo. Micaretas e baladas são danças do acasalamento que ninguém questionam, porque você passa a ser o chato, aquele que se esconde.

Gosto de festa, mesmo o porquê, festa não é balada que você mexe a bunda sem parar. Festa você conversa, você ri, você abraça, vê e conhece pessoas como são, conhecidas ou passam a conhecer (muitas vezes, seu parente traz um amigo). Diálogos de Platão não aconteciam em micaretas ou baladas – muito menos em pancadões de funk – aconteciam em banquetes (simpósios), onde as pessoas conversavam. Não somos pavões ou animais irracionais que precisamos de danças, no máximo, colocamos adornos para nos sentimos mais bonitos. Nos exercitamos – os filósofos gregos antigos eram famosos pelos seus corpos atléticos – para cuidar do corpo, queimar as gorduras a mais. Por outro lado, por que não, não fazer nada? O ócio era muito valorizado pelos gregos e pelas escolas gregas (a lição de casa foi inventada como um castigo por um professor italiano na era moderna).

A questão sempre envolveu o sexo. O sexo é o impulso da sobrevivência e da reprodução, já que, o ser humano faz as coisas a partir das vantagens e desvantagens sexuais. Nada tem a ver com o instinto animal da copula – não menos importante – e sim, com o impulso de um passarinho fazer o ninho, os betas fazerem a espuminha nas águas do aquário, os cavalos marinhos carregarem os filhotes. E esse impulso vem sendo controlado a milênios para o trabalho, para o poderio militar, para as outras coisas que o Estado acha mais importante. Até mesmo a liberação sexual foi sempre usada por empresas e corporações que ganham com isso – as empresas de preservativo sempre são as que mais ganham, mas, logico, usem se forem transar – e sempre se acha um meio para isso. Por exemplo, não se podia fazer amor em dia santo na era medieval, e quase todo dia era dia Santo. Porque não se podia ter tantos filhos nas aldeias medievais.

O ser humano sempre quis achar meios para terem força e dominar outros seres humanos para terem poder e dinheiro. Existem milhares de teorias que dizem que quem descobriu que existia medos, existia necessidade de proteção e que existia a necessidade de controlar aquelas aldeias (como botar ordem), tenha descoberto o poder. Mas, será mesmo vantajoso para a sociedade viver em jaulas institucionais? Será mesmo que o ser humano inventou uma coisa boa para a sociedade? Pelo menos os estados modernos me mostram que não, não foi uma vantagem para nossa espécie ter inventado uma instituição burocrática que nos diz o que fazer, inventam culturas para melhor governar e se recusam dar para nós, o básico para viver. Ou acham mesmo que esse besteirol todo nas mídias não tem nada a ver com os governos? Esse besteirol na indústria cultural não é do governo americano? Se temos bundas e carnaval, os yanques tem tiros e bombas. E assim, os pianistas como Nelson Freire e outros artistas de verdade, são ofuscados.

 

 

Amauri Nolasco Sanches Júnior




 

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