sábado, 21 de maio de 2022

Devemos ensinar religião nas escolas?




Há uma herança muito forte dentro da nossa cultura vinda da escolástica. Ora porque fomos colonizados pelos freis da companhia de Jesus, ora porque viemos diretamente das escolas portuguesas no primeiro período da colonização – antes mesmo, do marques de Pombal que introduziu uma escola mais moderna. Mas, essa obsessão religiosa sem o conhecimento religioso, vem de uma cultura – não tão pouco vinda da era medieval – que não se tem nenhuma salvação estudando e adquirindo o conhecimento. Ler e se questionar acaba sendo inútil. Mas acima das culturas e práticas medievais, está o positivismo de Comte, onde não há nenhuma salvação além dos especialistas. Mas, acima ainda dessa questão, nossa cultura prefere muito mais a prática do que a teoria. Nesse fator nos perdemos.

Tendo que responder em um fórum no curso de bacharelado de filosofia que estou fazendo, as perguntas são direcionadas no que diz respeito ao ensino de religião nas escolas públicas. Será que seria interessante ter ensina de religião nas escolas? Qual a religião que será escolhida para ser ensinada? Daí entra as questões perguntadas dentro da matéria Filosofia da Religião.

 

1) O que você acha do ensino religioso escolar? Deve ser confessional?

 

Temos que entender como nação – não só como cidadão – que existe várias religiões e pessoas que seguem essas religiões. Claro, que nesse mesmo contexto, os filhos (pelo menos, num primeiro momento) vai seguir o que os seus pais seguem. Além do mais, segundo a Constituição de 1988, o Estado brasileiro é laico para, exatamente, abrigar essas várias religiões que existem no Brasil. Aliás, o Brasil é muito famoso em ser tolerante com várias religiões e por não ter guerras ideológica. O fato é que, como todas as áreas humanas, existem fanáticos que não toleram o diferente. Tudo roda envolta da liberdade. Por quê? Porque tem a ver com escolhas e as escolhas têm a ver no que estamos carregando como subjetividade de valores.

Por isso mesmo as pessoas dizem que a religião tem a ver com a moral, porque ela se liga com os valores que nossos antepassados criaram. No caso de uma religião, se não concordamos, mudamos de religião e isso vai ser muito decisório do modo ético que vamos seguir. Acho – como muitos filósofos – que a questão religiosa tem muito a ver com as conditas morais das pessoas e como elas se comportam diante da sociedade. Mas, você pode me perguntar: onde fica Deus nessa história toda? A meu ver, Deus como entidade metafisica – desde Aristóteles – tem muito mais a ver com a espiritualidade e o mudo que enxergamos na ótica espiritual.

Deus tem o conceito segundo a sociedade que o interpreta, mas, a meu ver, seria impossível definir ele de forma exata.

2) O que fazer quando nem todas as confissões religiosas são oferecidas como ensino nas escolas?

Como disse um pastor num livro que estou lendo – A Religião dos Primeiros Cristãos de Gerd Theissen – a religião é semiótica e depende muito dos símbolos e imagens para se sustentar perante a sociedade. Portanto, quando dissemos que há uma necessidade de se ter religião nas escolas, se estar dizendo que as religiões devem ser aprendidas. Ora, a pergunta é: qual religião deve ser aprendida? Pois, há uma grande tendencia do nosso país de ser cristão – por ser colonizado por uma nação cristã – mas, tem um outro problema, porque há outras variações cristãs. Quais delas iriam prevalecer? As questões são bastante complexas.

A questão sempre fica nas entranhas da moral e dos costumes de um povo. Mas, aqui no Brasil, sempre tendemos a ser universalistas por abrigarmos milhares de outras religiões e outras culturas, mesmo o porquê, a base colonião sempre foi cristã. Então, e as religiões africanas? E as mitologias indígenas? Há questões a serem resolvidas e no ensino das religiões, tendem a ficar de lado por razões políticas e eleitorais. Quem iria votar em um candidato – sendo nossa sociedade em maioria cristã – que abra o ensino nas escolas para outras religiões?

 

3) O ensino religioso nas escolas públicas mantidas pelo Estado (municipais, estaduais e federais) deve ser obrigatório com a presença facultativa do aluno como prescreve a Lei vigente?

 

A meu ver, crianças não deveriam ser expostas a nenhuma religião até ter idade o suficiente para escolher. O Estado não deveria se meter nas escolhas individuais, deveria apenas ministrar uma grade que pudesse dar a chance de ser ensinado o básico. Além, claro, ser ministrado filosofia dentro desse currículo como a prática de uma ética mais forte – que estamos vendo, está muito enfraquecida – e, se poderia ensinar filosofia da religião que é muito mais profundo do que a própria religião.

Ao que parece – e isso é bastante importante – o brasileiro colocou a responsabilidade da educação em instituições públicas ou não. A ética e a moral não se aprendem só na religião, se pode ir as igrejas e ter uma vida religiosa regular e não ter ética, porque a ética tem a ver com caráter. A religião mexe muito com a moral, pois, a religião tem a ver com comunidade. O coletivo. O caráter tem a ver muito mais com o indivíduo e seus valores, ou seja, as crianças aprendem com o exemplo. Daí a educação, pois, educare latino é mostrar a realidade as crianças e não mostrar o que se quer mostrar dentro de um pensamento restrito. O pensamento brasileiro é restrito e tem raízes muito antigas que vão muito além do mundo moderno. Afinal, criamos os filhos para nós mesmos ou para a sociedade?

4) Que impacto o ensino religioso nas escolas pode causar na vida social, se os conflitos de interesses entre diferentes religiões não são resolvidos?

 

Não. Porque, inevitavelmente, vai tender favorecer uma religião. Segundo um livro que estou lendo sobre idade média, o filósofo fala que a própria igreja católica deixou os reinos laicos. Isso mostra como laicidade não tem a ver com ateísmo, mas, governos não deveriam ser ligados a alguma religião e ter liberdade para isso. Não sei se é verdade – mesmo o porquê, vimos várias resoluções medievais fanáticas – mas, isso mostra que mesmo que a própria religião tenta desvincular, as pessoas ficam muito ligadas a elas por questões de dependência afetiva. E no mais – mesmo que seus fundadores eram pacifistas como Buda, Jesus entre outros – a religião sempre foi levada para a política, sempre foi usada ou para a guerra, ou foi usada para convencer os mais humildes a fazerem aquilo que não queriam fazer. Isso tem nada a ver com a existência ou não de Deus.

Aliás, a existência ou não dele, parte da premissa de acreditar na existência de um ser superior, que está muito acima da nossa realidade no qual, nos encontramos.

5) De que forma e com qual conteúdo o ensino religioso pode ser ministrado nas escolas para garantir o diálogo interreligioso e a tolerância religiosa?

 

Esse “conteúdo” poderia ser um conteúdo universal e ecumênico. A questão é: sendo ecumênico, será que pais evangélicos vão deixar filhos lerem ou ver coisas de umbanda ou candomblé? Segundo essa ala do cristianismo – bastante radical – essas duas vertentes vindas da religião africana (ou matriz afro), são do demônio como herança de crenças dos senhores do engenho. Suspeito que esse “conteúdo” vai trazer muito mais discórdia – com a cultura que temos – e vai acentuar que quem manda nos filhos são os pais. Mas, a educação tem que ser, totalmente, dada por ele.

Me parece muito curioso quando vimos o brasileiro seguir aquilo até não mexer nas suas crenças profundas, porque eles não concordam. O grande problema, na maioria dos casos, é que aquilo que não concordam é a essência do negócio. No mesmo jeito, iria ser o ensino religioso.

6) Quem e como se deve capacitar e autorizar o professor de ensino religioso nas escolas públicas?

 

Essa é a questão – mesmo o porquê, quem iria dar esse tipo de aula – pois, como disse já, isso deveria ser ampliado com a filosofia da religião. Fazer discussões interreligiosas, ministrar conteúdos ecumênicos universais, pesquisar sobre as religiões do mundo. Quem vai se dispor em ministrar uma matéria tão ampla dentro das escolas, sendo elas, já saturadas com a própria matéria regular? A educação escolar brasileira é atrasada, pobre, vagabunda e ainda não supre as grandes tendencias do mercado hoje – pensando em fabricas de trabalhadores ao invés de construção de cidadãos – porque se tem uma cultura atrasada, onde políticos e industriais acham que o povo deve ficar ignorante. A questão é muito mais profunda do que isso.

 

Amauri Nolasco Sanches Júnior – 46 anos, técnico de informática, publicitário, filósofo da educação e futuro bacharel em filosofia. 

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