quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Deficiência e politica




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Amauri Nolasco Sanches Junior

Eu já escrevi vários textos sobre o assunto, além, de escrever o livro “O Clube das Rodas de Aço: Tratado sobre o Capacitismo”, que tem a parte social e a parte política do assunto. Não há políticas públicas para pessoas com deficiência através do governo, porque não é uma prioridade social por causa da visão capacitista da nossa cultura. Mesmo o porquê, a inclusão não é só uma rampa, não é só uma coisa material, mas, uma conscientização daquilo que nós somos como seres humanos. Precisamos de transporte, precisamos estudar, precisamos trabalhar, precisamos ganhar nosso dinheiro para até, comprar nossos aparelhos e nossas coisas. Quem não gosta de ter um celular bom para entrar na internet, telefonar, e até mesmo, ouvir música? Quem não gosta de passear e se divertir, namorar e até mesmo, casar? Somos seres humanos e temos sim, esses desejos e isso vai mais além do que a deficiência e o conceito que fizeram da inclusão.

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Inclusão é incluir, e tudo isso que escrevi, só é o meio disso acontecer dentro do espectro social. Ora, sem transporte (principalmente, os cadeirantes), não podemos estudar, fazer tratamento, até mesmo, trabalhar e passear. Quando um transporte importante – como o ATENDE aqui em São Paulo – da cidade determina que 25% de falta sua vaga é suspensa (como se não ficássemos doentes ou ficássemos com problemas com a cadeira de rodas), não conhece as deficiências e não conhece como proceder. Isso é fruto de um sistema burocrático que não conhece o assunto, porque não há especialista e para trabalhar nesse tipo de coisa, porque começam erros como esse (nem vou falar do itinerário e a manutenção e as adaptações erradas das vans). Daí vimos que há um capacitismo dentro da nossa cultura, que vem de uma cultura de séculos que não cabe mais dentro do século XXI. E isso só é uma parte da questão, tem outras políticas públicas que não há especialização de lhe dar com a deficiência, porque, antigamente, não havia nada para beneficiar as pessoas com deficiência. Por isso a minha crítica a programas como Teleton/AACD, porque representam o discurso antigo que transformam as pessoas com deficiência em coitados que devem ser protegidos e não expostos.

O que isso lhe parece? Por que ainda se tem esse tipo de discurso que coloca a deficiência como uma coisa a parte da humanidade? A maioria dos nossos conceitos vieram da cultura greco-romana, que matavam as crianças com deficiência ou deixavam a critério dos pais da criança (como povos germânicos ou hebraicos). O gesto é simples e pragmático: não teriam condições de cuidar dessas crianças com deficiência e tinha também, o fator da crença religiosa (que poderíamos até colocar como uma crença para convencer o povo). Mas, nem tudo foi tragédia e morte, em algumas cidades-estados gregas, as pessoas cegas eram tidas como pessoas sagradas e eram oráculos na sua comunidade. Diz a tradição, que Homero (poeta grego que recitava a Ilíada e a Odisseia), era uma pessoa com deficiência visual. A única cidade-estado grega mais dura na questão da deficiência, foi Esparta por causa da sua cultura militarista que exigia uma perfeição corporal, para ter soldados hábitos a combater com perfeição (os espartanos eram extremamente, orgulhosos). Atenas era mais discreta em deixar as crianças com deficiência dentro de cestas a noite, assim, ou eram comidos por animais, ou eram adotados por moradores de rua para pedir esmolas (como aconteceu na idade média também). Na parte hebraica (já que viemos de uma cultura religiosa judaico-cristã), diz estudiosos, que tem forte indícios, que Moisés era gago e que não falava muito em seus discursos (o seu irmão falava por ele). Isso mostra como a deficiência está presente dentro da humanidade desde quando o ser humano apareceu (no reino animal, também há deficiência, só que, são mortos por não poderem procurar comida), mostrando, que a capacidade humana de adaptação e adequação graças a sua consciência da realidade, é muito grande e pode fazer uma grande diferença.

Acontece, que até meados dos anos 70 ou 80 do século XX, as pessoas com deficiência eram trancadas em hospitais ou em instituições, abandonados pelas famílias que optavam por não cuidar das crianças com deficiência. Que é uma tradição medieval (embora há alguns relatos de pessoas com deficiência indo para a fogueira da santa inquisição), que pessoas com deficiência deveriam ficar em conventos ou deveriam ficar em hospitais mantidos para isso, ou eram pegos pelos moradores de rua para pedir esmolas nas portas da igreja. Já os índios, matavam as pessoas com deficiência (o modo diferencia de cada tribo), por causa da sua cultura nômade e a cultura que a deficiência era uma maldição dos deuses ou uma má sorte. Um outro exemplo, é que no judaísmo antigo, as pessoas com deficiência não poderiam subir no altar porque eram pessoas impuras e que por isso, eram indignas de subir no altar de Deus. Então, havia uma grande gama de medidas na antiguidade e até mesmo, a poucas décadas atrás, que escondiam essas pessoas do convívio social. Para se ter uma ideia, somente nos anos 90, que houve uma adequação tanto na Europa, quanto nos Estados Unidos (talvez, no Canada), para socializar as pessoas com deficiência e botar elas no mercado de trabalho para não pesar para os governos. Graças a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, que deu as pessoas com deficiência, uma imagem de humanização e que, somos pessoas como outras quaisquer.

No Brasil, com essa polarização sem propósito, a questão das pessoas com deficiência, na maioria das vezes, fica a cargo da esquerda por ter uma agenda de igualdade. Só que as políticas brasileiras são mistas, porque a nossa cultura é mista por causa dos milhares de migrações que tivemos, por sermos, um país originário de ser colônia de outro país (Portugal). Mas a questão é bem mais complexa do que pensamos, porque sempre achamos que medidas simples, vão resolver alguns problemas. O maior problema do Brasil é a burocracia, e o burocrata é um ser autômato, um ser que não pensa e só faz. Um burocrata que fica atrás de uma mesa, não vai saber se a pessoa com deficiência está ou não doente, que aquela adaptação está ou não adequada, ou aquele itinerário está certo ou não, ou que o transporte, os hospitais, as ruas, as calçadas, estão conservadas. Porque não está lá. Ele só segue ordens e não tem a capacidade de julgar. E isso transcende a questão da direita e esquerda, porque tivemos governos dos dois lados, e muito pouco se fez para pessoas com deficiência. Porque, seja na direita, seja na esquerda, sempre houve burocratas que faziam as regras serem seguidas e nem sempre, por milhares de vezes, essas mesmas regras eram as regras certas. Eram o que as pessoas com deficiência precisavam naquele momento. Então, não dá para dizer que os governos de esquerda (o petista), teve grande ganhos para pessoas com deficiência porque as cotas das empresas, não tiveram fiscalização, o transporte não teve melhoria, a educação não se melhorou e a vida das pessoas com deficiência nas cidades, não ficou fácil. Ter leis asseguradas não quer dizer ter leis aplicadas.

Então, temos que prestar bastante atenção na questão política que tem a ver com a nossa inclusão, nossa vida em sociedade e parar com essa mania de direita e esquerda. Dentro da deficiência existe algo muito além dessa questão, tem a ver com cobrança, tem a ver com prioridades e tem a ver com a nossa luta. O resto é só politicagem e populismo barato.

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