domingo, 9 de setembro de 2018

The Undateables e a “paralitica” da UnB





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Amauri Nolasco Sanches Junior

Imaginem pessoas diferentes com suas aparências que não são tão comuns para a sociedade, querendo, como outras pessoas, acharem seus pares para amarem. Porque, se essas pessoas são seres humanos, são como humanos e querem amar e ter uma vida como todo mundo.  Claro, que poderíamos colocar como um estereotipo do amor romântico, de ter o outro para cuidar e ser cuidado, de ter segurança para ter um relacionamento. Mas, logicamente, por serem diferentes, são vistos como pessoas a margem da sociedade. A questão mostrada no seriado documentário, The Undateables (algo como “Os Insuportáveis”), mostra o universo das pessoas com deficiência britânicas que tem uma vida normal, porém, não podem se relacionar por causa das suas deficiências. É claro “abiguinhos”, que ser uma pessoa com deficiência na Grã-Bretanha é muito diferente, em ser uma pessoa com deficiência no Brasil. Meu irmão mora na Irlanda, sempre me mostra pessoas com deficiência circulando normalmente entre os pedestres sem muito atrito (lá a maioria tem motorizada). Então, me impressiona essa diferença brutal, tanto cultural (onde pessoas com deficiência tem um tipo de trabalho, agencias de relacionamento não tem departamento diferenciado, pessoas com deficiência moram sozinhas e etc), quanto numa maneira estrutural (acessibilidade plena), num mundo onde as pessoas não subprotegem pessoas, mas, colocam as pessoas com deficiência como pessoas.

Onde quero chegar? Na série, isso fica bastante marcado, os pais não tentam tirar a ideia de um relacionamento com o outro. Muito pelo contrário, acham que os filhos deveriam sim ter um relacionamento com outras pessoas. Com todas as suas limitações, o físico Stephen Hawking, se casou duas vezes e teve filhos no primeiro casamento. A questão, pelo menos para mim, é olhar a pessoa e não a deficiência, porque a deficiência é uma característica que pode ser superada com a pessoa, com seus pensamentos, com seus relacionamentos, com a maneira de causar impacto e empatia ao outro. Daí começa a questão, porque há ainda, muito forte no nosso país, uma imagem de “coitado” que deveríamos esquecer de vez, mas, ainda é muito forte no nosso país.

Li na semana passada, que uma mocinha com paralisia cerebral, estudando na UnB, estava com dificuldade em deixarem a irmã de 11 anos a ficar no alojamento de estudantes, porque a mãe tinha que ficar com ela. Ora, vamos aos fatos, que me levam a escrever esse texto. Primeiro, o site Metrópoles usou o termo “paralitica” que além de ser errado, ainda transforma as pessoas com deficiência em meros “coitados” que precisam ser sempre amparados. Nós que escrevemos notícias, temos que ter extremo cuidado com as palavras, que podem ser interpretadas e assimiladas de forma bastante, erradas. Segundo, todos tem o direito de ter ou não uma pessoa consigo em qualquer lugar, mas, acho que deveríamos rever esse tipo de pensamento de dependência. Quando eu estava na FCD (Fraternidade Cristã de Pessoas com Deficiência), eu fiz minha primeira viagem aos 16 anos de idade, no interior, com os companheiros de movimento. Não tinha muito independência e também, tenho a mesma deficiência que a mocinha, paralisia cerebral. A paralisia cerebral não causa paralisia no cérebro ou algo desse tipo, mas, é uma falta de oxigenação na hora do parto, e alguns casos, podem ocorrer casos uterinos e até, por causa de meningite. Porém, raciocinamos tão bem, como qualquer ser humano.

Acima de qualquer discussão é salientar que devemos sempre acreditar e defender a inclusão. Incluir é deixar a pessoa ter um convívio dentro da sociedade e aprender a fazer adaptações para viver dentro dessa sociedade, pois, temos que adaptarmos cada vez mais a ela e vencer algumas barreiras. Por incrível que pareça, a questão moral e ética são questões bastante difíceis, por causa da nossa cultura. Uma cultura que gosta de “varrer para de baixo do tapete”, uma cultura que ainda sustentam associações assistencialistas, uma cultura que enxerga as pessoas com deficiência como “anjos” assexuados ou pessoas que atrapalham a vida cotidiana da sociedade. Uma sociedade que se diz tolerante, mas, não gosta de ver o diferente e o que acha ser, errado. Mas, o que seria certo ou errado? O que seria aquilo que deve ou não, ser aceito? A questão é quase uma questão subjetiva, porque vele a visão de cada pessoa como pode ver a cultura e a sociedade como um todo. Nosso povo acha que ser cidadão só envolve o nicho de cultura e comunidade que estão acostumados, e não é bem assim, existem outros setores que são tanto quanto brasileiros.

O que me incomoda é que esse tipo de escolha sejam escolhas padrões, assim, universidades não precisam ter acessibilidade para podemos frequentar. Que as pessoas com deficiência, sejam vistos como pessoas que não podem se virar, que não podemos ser felizes longe dos nossos pais, que não podemos ter uma vida. Inclusão não é ter só uma rampinha para a mamãe ou o papai, empurrar sua cadeira como um neném com um carrinho. Na maioria das vezes, quem olha feio para mim quando estou com minha noiva, não é quem está passeando (existem pessoas que acham bonito), mas, pais de pessoas com deficiência que não gostam de ver um casal namorando. Ainda mais, dois cadeirantes com paralisia cerebral. Por que? Não querem que sofram, não querem que se decepcionem, não querem que se frustrem. Mas, eu amadureci, graças a atitude dos meus pais de não me protegerem, de deixarem eu me decepcionar, de me frustrar e até mesmo, sofrer. Ninguém morre por causa do sofrimento, ninguém morre por ficar frustrado, a questão, é a nossa cultura de subproteção.

 O sofrimento não vai fazer as pessoas com deficiência, se transformarem de cristal. Frustrações não vão fazer s pessoas com deficiência, em sofredores eternos e que não podem superar essas frustrações. Somos humanos e temos sentimentos, mas, como todo ser humano, temos a razão e a racionalidade. Com a razão podemos mostrar que podemos superar algumas dificuldades, assim, podemos ser independentes com nossa deficiência. O que vi ali, foi nitidamente, um retrocesso a inclusão de pessoas com deficiência que deram a razão de não adaptação da universidade, ao não convívio aos colegas (como se alguma colega não pudesse ajudar a mocinha), ao de tomar decisões que no futuro, vai ser importante. Mas, como disse, cada um escolhe o que agrada. Só espero que essa escolha não seja padrão.

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