segunda-feira, 20 de maio de 2019

O rei cadeirante e o conselheiro (a mão) anão







Amauri Nolasco Sanches Junior


Eu gostei da série Games of Throne – confesso que não li nenhum livro – exibida na TV norte-americana, HBO. Como disse no texto sobre Daenarys, Games of Thrones ensina muito mais de politica do que muitas series que mostram os bastidores do poder. House of Card, por exemplo, mostra uma visão muito mais local da politica (no caso, a dos EUA), enquanto Games of Thrones, mostra uma coisa mais universal e histórica dentro do poder. Mas, como uma pessoa com deficiência, quero destacar dois personagens dentro do universo da saga. Uma é o Brandon Stark e o outro, é Tyrion Lannister. Porque, a questão do preconceito e de achar que somos inúteis – até mesmo na família – é bem pontual dentro de qualquer família. Tyrion teve um papel crucial dentro da saga e Brandon, mostrou um lado bastantes espiritual, da deficiência.
Tyrion sempre foi odiado pelo seu pai e sua irmã Cersei – no qual, no final, tentou salvar – por acharem que ele tinha matado sua mãe ao nascer. O único que sempre tratou ele igual foi Jaimes Lannister. Porém, além de ser a mão (seria o conselheiro) do seu sobrinho, que morreu envenenado, ainda ele foi da rainha Deanarys. Achei a frase “o amor mata o dever” bem interessante, mas, Tyrion disse que o dever mata o amor. Jon sabia que teria que matar Daenerys por causa da sua idealização do bem, pois, mesmo que quisesse a liberdade de todos os escravos, ela mataria inocentes. Eu achei os capítulos finais da série bastantes dentro da filosofia de Maquiavel, ou seja, o governante deve sempre procurar o bem, mas, não pode desmerecer o mal como uma das soluções viáveis. O mal foi feito para derrubar um reino tirânico e insano, mas, teve que matar sua libertadora para achar uma solução racional e pacifica.
Nada melhor que um rei que olha para o seu reino no ângulo de baixo, da proteção justa e que não queria ser o rei. O simbolismo da destruição do trono de Ferro foi o simbolismo da destruição da ambição, da guerra e da ganância. Não há melhor maneira de ter acabar com a ganância do o objeto de cobiça? A ira de Drogo (o único dragão que restou dos três da Deanarys), simboliza a destruição do poder irracional (que matou sua mãe) e um novo começo, com o poder racional, justo. Dragões tem um simbolismo de sabedoria (sophia) e isso é muito rico dentro das histórias orientais, no ocidente os dragões são o simbolismo do mal. Porém, a gente sabe que vários simbolismos que temos a igreja romana inventou ou deturbou, para dominar os camponeses ou aldeões (como apareceu também na série), que ainda acreditavam nos deuses pagãos.
Portanto, os dragões da série não são demônios ou símbolos do mal, mas, símbolos do poder da sabedoria. Quando um deles foi para o lado sombrio – como montaria do Rei da Noite – ficou a sabedoria para o mau, aquilo que está no inconsciente. O Rei da Noite simboliza as ideologias que criam zumbis, criam pessoas que morreram (como pessoas que desejam, amam e etc.), para se tornarem seus peões (como no xadrez). Mas, o dragão e os zumbir se disfacelam quando o líder é eliminado (sua ideologia vai junto com ele). Não vimos um monte ao longo da história e ainda temos um monte? Ora, há vários nas redes sociais que seguem esses “reis da noite”.
Tyrion mostrou o quanto uma pessoa pode amadurecer por ser diferente, no mesmo modo, há um grande amadurecimento no Brandon (quase todos os personagens). A limitação faz de nós, pessoas que podemos olhar o mundo de outra maneira e de outros aspectos. A visão mistica da deficiência (o corvo de três olhos simbolizando a sabedoria de Odin), não é nova, porque o ser humano rejeita aquilo que não tem certeza. A deficiência é uma variável perfeita dentro do aspecto da realidade (dentro da evolução), mas, no conceito determinista e ideológica, a deficiência acaba sendo uma entrave dentro do pensamento prático, o pensamento vigente e o pensamento que a essência perfeita. Mas, essências são como energias, não tem forma alguma. Todas as mitologias – ou a maior partes delas – fala de uma consciência sem forma nenhuma, e se não há forma, não há a perfeição da ideologia humana.
Por que a deficiência é uma variável possível? Porque dentro da evolução sempre teve um papel crucial dentro das mudanças dentro do nosso corpo e dentro da genética, sendo que mesmo as flores não são iguais, existem árvores com malformação, existem animais sem os membros. Adaptação sempre é o foco. Somos misticos – temos várias pessoas que vê coisas sobrenaturais, tem uma visão além da realidade vigente – porque o tempo para nós, é diferente. Temos que esperar. Sentimos mais. Temos mais sensações com as outras pessoas. Temos uma visão da verdadeira realidade.
Nossa visão é muito mais subjetiva – esse subjetivismo não quer dizer antiético – porque o ser humano é escravo do seu próprio conforto, pois, não há liberdade dentro da realidade religiosa e ideológica. A religião institucional leva ao desespero e a desconfiança (o suicídio de pastores é um grande sinal disso), a ideologia faz o ser humano querer um líder (que Freud vai chamar da visão paterna), que o proteja e faça sua vida feliz. Não encontra nada além daquilo e não descobra seu potencial e só vai encontra, se conhecer a si mesmo. As ideologias e as religiões sempre nunca barrarão isso de querer conhecer a você mesmo. Afinal, a quem o ser humano vai procurar se estará seguro de si mesmo? Mesmo acreditando no subjetivismo, acredito que temos certos valores éticos e morais.
O preconceito nasce do medo – já que a deficiência é um mistério que assusta o ser humano – porque desse medo, nasce várias lendas. Anões, currupiras, faustos, sereias, medusas e etc, que mostra um ligeiro julgamento errado disso tudo. A questão da deficiência sempre foi estranho, mas, não deveria ser. Na verdade, vendo os comentários sobre o Bran ser o rei, vimos muito a imagem do cadeirante como um sujeito que não presta para nada. O culpado disse por um lado, é da própria pessoa com deficiência que se coloca nessa condição, por outro lado, a mídia (na sua eterna exploração por causa de audiência) alimenta a imagem de “coitado”. Nem anjo e nem demônio, mas, um ser humano. Porém, a imagem do Brandon Stark como rei, é uma imagem de um rei que já tem embutido questões éticas, de justiça e questões muito além, porque somos atacados pelo preconceito e pela discriminação. Tanto Bran viveu isso, como o Tyrion viveu, mas, nunca renegaram a suas aparências. Eu defendo que as pessoas com deficiência deveria renegar toda a cultura que nos discrimina, ir para a cultura alternativa e esquecer tudo e toda a sociedade que nos rejeita. Eu leio livros, aprendo cada vez mais. Eu ouço rock que me dará uma visão crítica do mundo. Eu não tenho religião, porque não sigo nenhuma que me faz um sofredor e inútil (que sempre quer me curar). Não sigo nenhuma ideologia politica, pois nenhuma fala em acessibilizar, melhorar as condições não só das pessoas com deficiência, mas, da maioria.
Outra coisa que ninguém sabe, tivemos reis deficientes, tivemos imperadores deficientes. Presidentes cadeirantes que tiveram que esconder sua deficiência por vergonha. Tivemos todo tipo de governante com deficiência e nem por isso, eles foram bons e ruins. E isso não só a questão da sociedade, também é questão da família. Não pode sair com roupa tal. Não pode sair com fulano. Não pode escrever declarações de amor no Facebook. Não pode namorar. Não pode casar. Não pode sair com saia ou com um decote chamativo (como se a culpa fosse da mulher com deficiência ou sem deficiência). A própria pessoa com deficiência com a veneração da família, não cobra dela acessibilidade, não cobra dela liberdade e respeito, não cobra o mínimo de ética. Tyrion mostra o quanto isso é verdade. O quanto devemos sempre travar uma guerra para o amadurecimento (na questão da família, escrevei outro texto).
Gostei no final e gostei que o rei foi um cadeirante.




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