Ser
de esquerda é, como ser de direita, uma infinidade de maneiras que o homem pode
escolher de ser um imbecil: ambas, com efeito, são formas de paralisia moral.
Ortega usa nessa frase “paralisia moral” como formas de ser
um imbecil por seguir um lado com tanta paixão. Mas o que seria essa paralisia
moral? Na verdade, a edição francesa do livro de Ortega “A Rebelião das Massas”– uma das suas maiores obras – se escreveu hemiplegia moral. Num conceito clínico
(médico), hemiplegia é uma paralisia em um lado só do corpo, ou seja, uma
pessoa hemiplégica é uma pessoa que é paralitica em um só lado. A meu ver, acho
paralisia muito mais adequado, mesmo o porquê, quem defende um só lado, se
defende um todo e se fica paralitico moral como um todo. Não se enxerga as
coisas errados que essa ideologia, porventura, pode fazer. Ortega queria dizer também,
que o pensamento político – pura e simplesmente – é limitado e só o pensamento filosófico
pode ser considerado inato ao ser humano.
E o porquê Ortega coloca na filosofia essa responsabilidade?
A filosofia, enquanto ferramenta de reflexão, dúvida dela mesma enquanto
pensamento definitivo. Ora, se ela duvida dela mesma, quem dirá esse “cobertor
quentinho” que você escolheu para chamar de seu. Na sua natureza mais intima, a
filosofia dúvida dos ídolos, das certezas de que se tem de alguma coisa que são
incertas. O mundo não há nenhuma certeza, a realidade não tem nenhuma certeza. Tudo
é um conglomerado de incertezas e fatos que mudam conforme as coisas vão evoluindo.
Por que acreditar em uma só religião, por exemplo? Se há uma Força geradora da
realidade (tudo que há), então, não há sentido nenhum em achar que cada “Deus” é
o certo a seguir. Mesmo o porquê, na antiguidade, se acreditava em deuses. Se há
uma só Força ou consciência, por que tenho que acreditar na sua explicação? Não
se filosofa com certezas, se filosofa com dúvidas e com o espanto de perceber
que não há certeza nenhuma na vida. Afinal, o que fazemos no mundo além de
aprender e compreender a realidade?
Ai que chegamos a filosofia de Ortega: amar a realidade
enquanto circunstancia daquilo que somos. A título de exemplo, estou no Brasil e
tenho pensadores e uma cultura que foi construída durante quatrocentos e
algumas décadas – não sei precisamente – não temos que rejeitar as obras
brasileiras por fazer parte da realidade onde eu vivo. Aliás, Nietzsche já tinha
dito isso no amor fati, onde temos que aceitar nossa realidade e amar ela como
um único momento de comunhão entre você e a realidade. Mas o que seria a
realidade a não ser aquilo que você mesmo interpreta como verdade? O próprio Nietzsche
disse que não havia verdades absolutas e nem fotos eternas, porque vem mudando
conforme os valores mudam. Então, esbarramos sempre em cima das incertezas da
vida e a partir dessas incertezas achamos ter descoberto as verdades.
Eu sei que ser de esquerda é ser favorável a uma mudança revolucionária,
pois, o socialismo (que chamo de extrema esquerda) é um regime que não deu
certo. Mas a direita – o liberalismo clássico e o conservadorismo que nada mais
é, do que um ceticismo moderno burguês – tendem a achar que mudanças repentinas
são perigosas e muitos acabam sendo reacionários (pessoas que idealizam o
passado). Na essência não existe nenhuma diferença entre as duas utopias (até
mesmo, o liberalismo acaba sendo uma utopia), porque entre a idealização do
passado e idealização do futuro, existe um agora e é ai que esta sua realidade.
Por isso que Ortega vai dizer que quem se entrega nessas duas vertentes acaba sendo
um imbecil (tolo), pois, no final das contas, o hoje que estamos vivendo. Isso parece
muito com os filósofos budistas, onde só existem o agora e nada mais, e assim,
evita ansiedade e decepção. E indo mais além – e isso está registrado em vídeo –
concordo com o filósofo francês Deleuze, quando ele diz que não há governo de
esquerda. Quando a esquerda toma o poder ou são eleitos, viram situação.
A questão da política é muito mais profunda do que uma separação
artificial que começou na revolução francesa.
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