quarta-feira, 25 de agosto de 2021

O coitadismo global

 

 


Amauri Nolasco Sanches Júnior

 

O nome do texto como um trocadilho não é por acaso, pois realmente o coitadismo está em pauta atualmente. Não que não ache que em algum momento, a humanidade tem uma fase de evoluir e de achar meios de se ter alguma empatia, estou me referindo ao drama que a Globo e outros canais querem sempre promover em cima da deficiência. Sempre alimentando aquela velha história que quem tem uma deficiência – e isso vem de milênios – é um eterno sofredor que faz as grandes ditaduras teológicas ou ideológicas, eliminar nós da face da Terra. E isso não é só de dentro de religiões ou dentro de resoluções políticas – como aconteceu no socialismo soviético ou no nazismo alemão – mas, existem ateus que acreditam na mesma coisa e são cientistas. No caso de o biólogo Richard Dawkins dizer, em 2015, que seria imoral uma mãe ter uma criança com síndrome de Dawn.

Fazendo uma reportagem no portal Blasting News – que quase ninguém nem lê – as fontes sempre salientavam a deficiência e não a capacidade de todo ser humano de superar suas dificuldades. Mas, a do Globo Esporte exagerou com um tom apelativo que sim, beirava ao coitadismo e exemplo de superação. Segundo a reportagem, além do nadador Gabriel Bandeira (21) ter conquistado a medalha de ouro, o outro Gabriel, o Araújo, conquistou a medalha de bronze e escreveram: <<Após a façanha nesta quarta-feira, ele não se conteve e chorou.>>, como um meio de fazer com que o publico se emocione com uma coisa que muitos atletas podem fazer. Ele pode? Claro. Muitas conquistas minhas foram comemoradas comigo se emocionando, mas o tom do jornalista e o tom que não tem diferença nenhuma das do ministro da educação. Além de tratar o rapaz como crianças.

O Gabriel disse:

“- Fico muito feliz, só eu sei o que passei para estar aqui. Foi muito difícil. Essa medalha veio com muito esforço, suor e me deixou com gostinho de quero mais - disse Gabriel, que se emocionou na entrevista concedida logo depois da conquista.”

Por que enfatizar falas como esta como se fosse uma conquista – como válida – uma medalha de bronze? Como eu disse, não condeno ele falar como não condeno o jornalismo dizer aquilo, o ponto é a incapacidade das pessoas de apenas mostrarem isso. E além de ser um modo de se reduzir a deficiência a um modo de superação – como se só isso fosse importante – ainda coloca o deficiente como agente de mostrar a humanidade que só há um caminho, a superação por meio do corpo. E os inúmeros escritores com deficiências? Os trabalhadores que têm que renunciar a um salário da profissão para ganhar bem menos só por causa da deficiência? Me parece uma linguagem fraca – não muito diferente dos programas como o Teleton – que só alimenta a imagem infantil e de doença da sociedade brasileira.

Como já disse no meu Facebook, o problema do presidente e todo esse pensamento em torno da deficiência – incluindo a linguagem usada no Teleton – é culpa do próprio agente com deficiência que alimenta esse tipo de linguagem e se comporta como criança. Acha que superar é apenas sair, andar de ônibus e aceitar qualquer salário que não corresponde ao curso que fez. Não há nenhum problema de começar por baixo, mas, começar por baixo é uma coisa, aceitar migalhas é outra.




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