Amauri Nolasco Sanches Junior
Para as pessoas com deficiência – com uma educação capacitista
e que sub protege os filhos em geral – a sub proteção uma realidade e faz delas
muito mais vulneráveis. Por que? Ora, uma das coisas que me fizeram escrever
esse texto é um dos episódios da série Black Mirror (espelho negro), Arkangel,
que é exibido na Netflix. Esse episódio – que é o segundo da quarta temporada –
começa com o parto de uma mulher chamada Marie. Só um parêntese: todos os episódios
ou a grande maioria, sempre tem um nome que acaba sendo o principal. Continuando,
essa mãe (mulher), já apresenta uma obsessão pela filha. Tanto é, que leva a criança
com seus 3 anos de idade, em um carrinho de bebê (que caracteriza bem a questão
da proteção excessiva), mas, a menina demostra medo por um cachorro, que para
Marie, era uma coisa bastante horrível (imagine meu filho ter medo). No parque
a menina seguiu o coelhinho e se perdeu não sabendo voltar mais. Isso fez a mãe
colocar um sistema, que muito mais tarde muitos países baniram, chamado
Arkangel que era um monitoramento do que a criança vê, ou seja, onde ela está. Já
pensou se ela existisse? Qual é o limite de se vigiar um filho ou o limite da
liberdade? O fato é que a mãe afastou o namorado – porque ela transou e usou
uma vez cocaína – e começou a cercar a menina como um medo de perder ela um
dia. Só que vai perde o filho, porque você cria o filho para o mundo.
Se essa tecnologia existisse a paranoia dentro das redes
sociais e fora dela iria ser imensa. Como já existe com essa paranoia de que estão
doutrinando as crianças com ensinamentos de esquerda (leia-se: comunismo), se
esquecendo que o PT (Partido dos Trabalhadores) subiu ao poder por culpa de
cada um que votou nele e a maioria nem sabe o que é o comunismo. A questão mais
importante que eu observo é que a nossa cultura é bastante estranha, quando deveríamos
ser coletivos, acabamos sendo individuais e quando deveríamos ser individuais,
acabamos sendo coletivos. Um exemplo bastante pratico, se você parar numa vaga
destinada as pessoas com deficiência é um ato coletivo (moral), se você respeitar
o outro como um cidadão (exercendo seu direito de liberdade de ir e vir e de
livre expressão) é um ato coletivo. Agora, falas como da ministra do Bolsonaro,
que meninos deveriam usar azul e meninas usarem rosa, é uma individualidade dos
pais resolverem o que eles devem usar (ético). Não acredito que ensinar as crianças
a respeitarem as diferenças vão “sexualizar” as crianças ou vão fazer elas
serem comunistas. A questão, que acho, que traz o episódio do Black Mirror é a
liberdade e o amadurecimento que muitos pais privam seus filhos como se fossem
bonequinhos de porcelana.
Nesse próprio episódio mostra a proteção exagerada de medo
da perca, do apego a alguém que você não tem pleno controle. O limite de vigiar
teu filho é o limite dele saber o que tem ou que não tem que fazer, que um dia
vai sentir medo, que um dia ela vai estar em perigo e um dia esse filho vai
sofrer por amor ou uma simples paixão. Não tem nada que você faça isso vai
mudar. Como acontece no episódio, ela acaba perdendo a filha por vigiar ela. O limite
de cuidar é o limite da liberdade desse filho ter ou não, uma vida adulta. A grande
sabedoria do mestre Yoda que diz que o medo gera o ódio e o ódio nos leva para
o lado obscuro da força, um lado animal (reptiliano), ao lado de não ter levado
um não e nunca ter se deparado com a frustração. Quantas pessoas são assim? Quantos
homens matam suas ex-mulheres por causa da educação que homem podia fazer o que
quisessem? A questão é o limite da liberdade. Educar não é ensinar moralismos
ou ensinar religiões, educar é ensinar valores para o convívio social.
A educação do nosso país é uma educação que ensina as crianças
a não serem críticas, a respeitar as decisões do outro. Por que? Porque estamos
ensinando a olhar o outro como um objeto e não como um ser humano, um ser que é
soberano em sua vontade e da sua inciativa em não aceitar aquilo que é imposto.
Por isso tantas pessoas impondo as resoluções e não aceitando que o outro pensa
ou quer. No segmento das pessoas com deficiência é bem pior, principalmente, se
você vê o relacionamento entre as pessoas com deficiência física com a família.
Há casamentos de casais com Síndrome de Down, há casamento de pessoas com deficiência
auditiva ou visuais, sem nenhuma confusão ou subproteção. Claro que nem todas
as famílias são assim, algumas podem encarar essas nuances da vida como até
normais e sem crises imensas. Mas as minhas observações me levam a crer, que existem
um pensamento muito enraizado, que a limitação é um impedimento para ter uma
vida normal e ser feliz. Conheço amigos que as mães falaram para os padres não fazerem
o casamento, que veladamente, atrapalhavam a paquera do filho para ele não sair
de perto dela. Além de não deixar ele ir em movimentos, como se os movimentos não
quisessem fazer as vontades do meu amigo, e ainda, vai junto fazer tratamento
com o cabra com quase 50 anos nas costas.
Talvez o nome da série revele o seu significado, pois, Black
Mirror tem uma tradução, mais ou menos, de espelho negro. O que há num espelho
negro? Uma escuridão onde ainda há o seu reflexo. Teu lado sombra aparece como
uma sombra sua que você não conhece. Às vezes, essas mães não sabem que estão criando
crianças que tendem a ser depressivas pela carga de proteção que recebem e não importa
se são alvejados de viagens ou de cadeiras de rodas sofisticadas, isso é um
materialismo bobo e infantil. A questão é
que sempre vai haver um ser que não provou o sofrimento, não provou o prazer de
uma paixão correspondida, um beijo na boca bem dado e isso, vai ficar no limbo
das incertezas (falando em física quântica). A questão é sempre que a inclusão é
a máxima desvinculação de uma família, não deixando de amar ela e respeita-la,
mas ter a certeza que um dia você vai perder ela. E assim, não criar adultos
retardados que pensam ser crianças.
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