terça-feira, 20 de novembro de 2018

Vida solitária de um cadeirante e vencendo o medo



Foto do Vader daqui (risos)



Amauri Nolasco Sanches Junior
(42 anos, formado em filosofia da educação na FGV e também, formado em publicidade pelo IPED e técnico de informática pela ETEC Parque Santo Antônio)

Quando a vida nos desafia, temos que encarar esses desafios e dizer para vida que você aceita o desafio. O medo existe, esse medo é normal para temos mais cuidado com certas situações. Mas, o medo em excesso vira fobia e as fobias não são tão boas. Porém, o medo gera uma certa raiva que você queria fazer e não consegue ou não pode fazer, por causa dela e não sabe que é uma questão dela mesma e não dos outros. Conhecendo a si mesmo e suas limitações e o que seu poder – mesmo que esse poder seja apenas poder sair – pode fazer, você conquista uma galáxia. Parece uma coisa contraditória, mas, vendo meu boneco (adquiri recentemente) do Darth Vader não é não. Aliás, sai sozinho, pela primeira vez em 42 anos de vida.

Quem lê meus textos sabe que eu sou uma pessoa com deficiência física e sou cadeirante, mas, por incrível que pareça, mesmo com minha cadeira motorizada. Eu sempre saio com as pessoas e não tinha o habito de sai sozinho, mesmo o porquê, minha deficiência não me dá forças nos braços para sair com a cadeira manual. Neste domingo, com o transporte já marcado, mas, com o rompimento do meu noivado, eu decidi encarar o desafio de sai sozinho e encarar o medo de ficar lá sem ninguém conhecido (como sempre estou lá, os seguranças sempre me conhecem do shopping). Gostei de encarar esse desafio e prestei mais atenção em mim, nas minhas vontades, naquilo que eu quero comer, daquilo que eu quero vestir, aquilo que eu preciso. Prestei atenção em mim mesmo e prestei atenção naquilo que eu posso fazer. Mesmo com o pneu dianteiro murcho, mesmo com as dificuldades, eu voltei para casa com o desafio feito e encarado. Talvez, esse papo de que a vida te coloca desafio para você evoluir seja verdade, e é o que acredito como um bom espiritualista que sou.

Mas, podem me perguntar: o que tem a ver Darth Vader com isso? Bom, eu vou explicar da maneira que sei explicar, controverso e filosófico. A maioria do nerds e geeks (como eu), sabem, que toda a saga do Guerra das Estrelas (Star Wars) tem dois pilares, a filosofia zen e a segunda guerra mundial. Os Jedis, nitidamente, têm raízes no zen budismo por ser algo que o criador, George Lucas, segue e a segunda guerra, por ele (Lucas) ter ascendência judia. O maior templo budista que se tem notícia foi o templo Shaolin na China, onde eram feitos treinamentos espirituais severos a partir do zen e se tinha os monges da linha clara e os monges da linha escura, como os Jedis e os Siths. Só que para os budistas – pegando a raiz de Buda Gautama – não existe o bem ou o mal, existe o conhecimento e a ignorância. Pessoas ignorantes podem fazer o mal para outras pessoas, podem ter ódio de coisas que não entendem ou não podem entender. Os que tem o conhecimento, não podem fazer isso porque sabem como funciona as leis universais: se você fizer algo esse algo molda toda a sua realidade e essa realidade fica boa ou má, conforme suas atitudes.

Anakin Skaywaker era o jedi mais poderoso que se tinha noticia, tinha componentes da FORÇA fora do normal. Foi resgatado de um planeta remoto como escravo junto com sua mãe pelos jedis Qui-Gon Jinn e Obi-Wan Kenobi. Qui-Gon sempre acreditou que Anakin era o escolhido para equilibrar a FORÇA novamente e trazer paz ao universo, como estava na profecia dos jedis. A mãe de Anakin jurava que ele foi gerado sem um pai e então, isso faz dele, muito mais especial (e dará um ar maior de escolhido da Força). Muitas pessoas vão ligar Anakin a Jesus numa análise superficial, mas, são analises muito pobres da questão. Todo relato de escolhidos são assim, deuses e anjos avisam e eles são concebidos sem pai para mostrar o lado imaculado do útero que gerou a criança mostrando assim, que o sexo é pecado ou é sujo. O lado do prazer que as religiões desprezam e condenam, porque são concorrentes muito perigosos. Já pensaram se o ser humano sentisse prazer e não se ligasse dos problemas da vida? O que seria das religiões que darão sempre um caminho? Estou falando da verdadeira espiritualidade que só é aprendida no esoterismo de cada uma dessas religiões que existem. Todas. Mas, voltamos a Anakin.

Foi treinado. Não por Qui-Gon que morreu salvando Kinobi e Anakin, mas, pelo próprio Kinobi na qual, quando se tornou Lord Sith, Anakin o matou. Não faço uma análise rasteira como fazem vários esotéricos que não entendem a mensagem filosófica dentro da saga. Primeiro, os sabres de luz mostram muito dentro de quem é quem, porque os mestres jedis tem os sabres azuis (que mostram a espiritualidade) e os mestres siths tem sabres vermelhos (mostrando o poder). Alguns colocam como os nazistas e os aliados, que também é uma visão bastante válida, mas, estou analisando por outro viés. Outras características interessantes podem ser mostradas, como a obsessão sith de colocar androides, componentes eletrônicos, e até mesmo, modificar o corpo. O próprio Anakin, por ter sido queimado por larva vulcânica após um duelo com seu mestre, foi modificado com componentes eletrônicos. Mostrando o lado materialista.

Anakin não conseguiu desapegar da mãe e quando foi buscar ela, viu ela morrer nos seus braços. O problema do desapego é muito retratado na saga, porque tem a ver com a questão do sentimento, aquilo que temos medo de perder. E quando temos medo de qualquer coisa, sempre tudo que temos medo aparece para trabalharmos esse medo, e o desapego é o medo da perca do amor, do desaparecimento daquilo ou de quem, amamos. Quando desapegamos, deixamos esse alguém ir e não sofremos, ficando só o amor. Anakin não fez isso e viu a mãe morrer. Não se desapegou de Padmé e viu, também, ela morrer (ele mesmo tentou enforca-la), e por medo de perde-la, se associou ao senador Palpatine e que foi, o imperador sith da republica galáctica. Mas, o amor não é tão maléfico, não pode ser tão nocivo ao mundo espiritual ao ponto de ser proibido dois seres ficar juntos. Um mestre da arte jedi, não pode se casar (não pode na velha ordem, depois, seu filho Luke modificou isso).

Vou chegar numa outra questão que todo mundo concordará. Por que, com tantos heróis, ainda Darth Vader é o personagem mais interessante da saga? Porque, se queira ou não, Anakin era o mais poderoso jedi e o escolhido, mas, não nos moldes de uma moral jedi já ultrapassada que não enxergou o obvio. O sentimento fez Anakin ser o lord sith mais poderoso da galáxia conhecida e deixava cada planeta ter sua própria cultura. Porém, foi o sentimento dele que salvou seu filho do imperador e morreu. Ele equilibrou a FORÇA e livrou a ordem republicana do império. O desapego, muitas vezes, pode ser encarado como uma indiferença com quem amamos, pode sim fazer sofrer se amamos com força, mas, todas as forças podem anular a FORÇA maior, como diz a teoria newtoniana. Mesmo sendo escravo, mesmo sendo um jedi incompreendido, mesmo sendo um lord sith, ela supera sua dor e seu medo, e traz de volta o equilíbrio e fez o que quis fazer. Conquistou vários planetas com o corpo queimado, sem um braço, sem uma perna e o corpo robótico. Sem contar, que sem a roupa com a máquina, ele não respira. Quantas pessoas com deficiência, mesmo com tantos aparatos, nem saem de casa?

Na essência, a saga é uma saga psicológica entre o que você é e o medo daquilo que esconde o que você é. A saga do herói de Campbell (que ajudou Luccas a escrever toda a saga por ser um mitólogo de renome), é a essência do Star Wars como uma saga psicológica da renegação do herói em fazer a aventura. No Ilíada, Aquiles se recusa no primeiro momento de obedecer a Agamenon e ir para Troia, até a mãe dele dizer que ou ele fica e é esquecido, ou ele vai e seu nome escoara por toda a eternidade. No mesmo modo acontece com Anakin que a mãe lhe convence a ir cruzar novas aventuras e ser um mestre jedi livre. A mãe representa a segurança, o útero que lhe gerou e lhe deu a vida, a segurando do “quentinho” de não enfrentar o mundo. Mas o mundo deve ser enfrentado. O mundo é onde vivemos e aprendemos a ser seres humanos. Com a doença da minha mãe e ela ir para o mundo espiritual, aprendi que é muito fácil você ser corajoso com ela por perto, mas, é extremamente, difícil, ser corajoso longe dela. A vida nos ensina com a solidão. Quando o útero que lhe deu segurança e conforto, não está lá para te dar segurança, se deve andar com as próprias pernas. Anakin não viu, ele deixou esvair na culpa, temos também um sentimento de culpa, mas, passa. Mesmo ele sendo lord sith por esse ódio, ele aos poucos, se deu conta que ele se tornou de novo um escravo do imperador e já queria derruba-lo.

O imperador é a ignorância do falso EGO, aquele que nutre somente a si mesmo. O filho (Luke) é o seu alter ego (outro eu) querendo te curar da ilusão (sabe de luz verde) e a filha (Leia), é a retomada do controle da liberdade. Mas, você salva seu alter ego e seu lado sombra morre para renascer seu lado espirito, a sombra é a meteria. Transcender seus medos é um pouco enfrentar o instinto de preservação do corpo, porque o corpo é comandado pela alma e não ao contrário. A questão é: que para deixar nossa caixa de conforto, a dor é imensa, você tem que deixar o útero uma hora e seguir em frente. Desculpe, mas, Star Wars é a saga dos Skywakers e ensina sim, transcender o nosso medo, transcender o nosso lado material, transcender a existência de algo maior e nos ensina que o que nos move é a FORÇA. Sai no domingo (18) e venci meu medo de deixar a casa (útero) sem ninguém por perto, venci meu medo de não saber fazer, vi que eu sou capaz e fiz o que era para fazer. Como Anakin (de maneira um pouco diferente), perdi duas pessoas que me davam segurança, tive meu momento de Darth Vader em ter ódio, mas, consegui ver além do ódio e não acho que devemos renegar ele, pois, muitas vezes, é esse ódio que nos faz sair da caixinha confortável. Estou redescobrindo minha vida e vou ter que me readaptar. Quem sabe, ter mais controle comigo e como dizem, vida que se segue.



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